terça-feira, 13 de outubro de 2015



"Queres saber quem sou? Eu sou o que te olha e espia para te colher e depois guardar num lugar que é só meu. Para isso serve o papel. O resto não precisas de saber. Nem convém. Só te is distrair, podes crer. Eu sou o que mergulha as mãos na tua vida para sentir a minha a voltar. 
Eu sou o que tu quiseres. Quando quiseres. Quando me encontraste não sabias o que procuravas. Só de longe o soubeste, e agora esqueceste. Não fomos feitos para o amor, acrescentas. O que não quer dizer que não possamos amar-nos sempre outra vez, e pode ser mesmo a única coisa digna. foi para isso que fomos feitos. Não fomos feitos para mais nada. Nascemos, crescemos, envelhecemos, morremos e é tudo. E é mais do que o suficiente. Quando o barco começa a naufragar o que importa é a atitude dos passageiros. Saber que o barco vai naufragar e mesmo assim continuar.
O que interessa é a atitude, insistes. Mais não podemos. Não podemos fazer nada, mas podemos mudar tudo, é isso que dizes? Começar por nós, terminar em nós. Mudar-me a mim e mudar o mundo. Começar por mim e acabar em mim e mudar tudo à minha volta. Se já reparei? Ao tornar-me melhor o mundo fica melhor? E ainda me pedes que não tenha medo e deixe de esperar o impossível? O barco pelo qual espero é o barco em que vou. Quando partiu esse barco? Isso gostava eu de saber. Há muito. Antes de mim. Mesmo sem mim. E vai naufragar, de qualquer modo vai naufragar. Todos os que passaram por aqui o souberam, e isso não os impediu de fazer o que tinham de fazer. Que eu nunca sou apenas eu. Uma corrente nos leva. Uma corrente de palavras. Uma corrente de amor. Passar o que por nós passa, que o que passa nem é meu, nem teu, nem nosso, nem as palavras, nem o amor. Passar isso o melhor que se possa e mais nada senão isso. Queres que me cale? Sim." - Pedro Paixão

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