quinta-feira, 9 de novembro de 2017





"Todas as pessoas lidam com a frustração, diariamente. Para ti, não teres o pijama da cor certa, na altura certa, é extremamente frustrante. Para mim, a frustração surge quando deixo cair uma folha de papel ao chão e não existe nenhuma maneira de a apanhar, ou quando chego a um restaurante e descubro dois degraus junto à porta. 

A raiz da frustração é o desejo. Como és uma criança, tu esperas teres os teus desejos satisfeitos de imediato. Em muitos aspectos, mesmo quando já depois de adultos, ainda desejamos recompensas instantâneas. Eu quero o que quero naquele instante. Quero aquela folha de papel que deixei cair ao chão e já! Quero a amante perfeita e quero que a minha bexiga funcione e quero o meu cabelo de volta!

A questão não é se temos ou não desejos, porque todos os temos. Nós temos desejos em relação à comida, ao amor, à segurança e à felicidade. Também desejamos que tomem conta de nós.

A grande questão é: como é que gerimos o desejo? Como agimos em relação às nossas vontades? Como lidamos com a frustração quando os nossos desejos não são satisfeitos?

Quando a tua mãe e a irmã eram pequenas, costumavam gozar com uma das minhas maiores frustrações. Enquanto me deslocava pela casa na cadeira de rodas, às vezes fazia as curvas muito apertadas e batia contra a parede. Quando isso acontecia, eu dava um murro na parede e praguejava.

Quando a frustração não é trabalhada, transforma-se em raiva e a raiva despoleta a acção. Eu batia com a mão na parede e gritava. Tu tens ataques de fúria e choras. Esta é a nossa resposta às emoções que sentimos diariamente e que, por vezes, achamos serem intoleráveis. O problema não é como é que tu ou eu nos sentimos quando estas coisas acontecem. O problema surge quando não conseguimos tolerar esses sentimentos.

Eu aprendi com as minhas filhas. Sempre que esmurrava a parede e demonstrava a minha raiva, elas riam-se. Eu ouvia-as dizer:

- O papá deu outra vez um murro na parede!

Passado algum tempo, sempre que eu batia contra a parede, dava um murro, praguejava e, a seguir, ria-me e brincava com elas:

- Iupppiii! O papá bateu na parede!

Talvez não fosse muito mau bater na parede. Talvez a parede ali estivesse para me ensinar algo.

Há vários anos, num agradável dia de Primavera, eu estava no relvado em frente à minha casa. Não estava mais ninguém. Infelizmente, a roda da minha cadeira ficou presa no buraco de uma toupeira. Acelerei o motor, para andar para a frente e para trás, mas não aconteceu nada. A cadeira não se mexia.

Isto aconteceu a meio do dia, quando não havia vizinhos por perto e não estava em casa nenhuma enfermeira que me ouvisse.

Por isso, gritei por socorro, não apareceu ninguém. Gritei ainda mais alto, o mais que pude. Mesmo assim, não apareceu ninguém. Por pura frustração, comecei a bater com a mão no braço da cadeira de rodas. Bati com tanta força que a minha mão começou a sangrar. E, quando vi isto, gritei outra vez, só que mais baixinho. E, de seguida, comecei a chorar, face à minha incapacidade.

Após ter chorado durante algum tempo, simplesmente desisti. Não gritei mais. Já não voltei a bater com a mão na cadeira. Não tentei acelerar o motor. Fiquei, simplesmente, sentado.

Tinha batido contra a parede.

E foi então, apenas nesse momento, que ouvi os pássaros a cantar. É claro que eles tinham estado sempre a cantar, mas eu estava tão obcecado com o meu desejo de tirar a cadeira do buraco e a lutar tanto contra os meus sentimentos de frustração e a fazer tanto barulho, no meio de tudo isto, que fora incapaz de os ouvir. Era perfeitamente razoável querer ser salvo, mas o meu desejo não ia ser satisfeito de imediato. Foi só quando aceitei este facto, só quando parei de lutar, é que tive alguma paz.

Eu vejo este processo acontecer-te vezes sem conta. Quando as coisas não acontecem como tu queres, ficas furioso e choras. E, depois, avanças. Será que a tua frustração vai ser sempre assim tão forte, ao longo da tua vida?

Desejo que, à medida que cresces, o processo se desenvolva com maior rapidez e consigas encontrar paz, sem tanto sofrimento.

Lembra-te apenas de que, quando conseguires encontrar a paz de alguma maneira, podes refugiar-te nela quando esbarrares contra a parede." - Daniel Gottlieb

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