quarta-feira, 16 de dezembro de 2015



"Eram dois jovens que sentiam um profundo e imenso amor. Tinham decidido viver juntos, mas tinham medo que a convivência pudesse malograr ou diminuir o seu amor apaixonado. Por isso, decidiram ir visitar um homem muito velho e que tinha fama de sábio. Vivia num bosque, e os jovens, de mão dada, apresentaram-se diante dele e disseram:
- Venerável sábio, tomámos a liberdade de te incomodar porque o nosso coração está confuso. Necessitamos dos teus conselhos. 
O ancião olhou-os demoradamente. No seu rosto enrugado ressaltavam uns olhos belos e compreensivos. Um leve sorriso brilhou-lhe nos lábios e concordou com a cabeça, pausadamente, como se convidasse os jovens a exprimirem-se.
- Amamo-nos tanto - disse a jovem -, que queremos viver juntos, mas temos medo. Gostaríamos de passar toda a vida na companhia um do outro, mas sabemos que nem sempre é fácil e por isso procurámos o teu conselho.
O ancião apercebeu-se de que estavam profundamente ligados um ao outro. Comoveu-o essa paixão que parecia impregnar aqueles corpos tão jovens e tão esbeltos.
- Eu não faço outra coisa a não ser dedicar-me à meditação - disse o sábio -, mas quero ajudar-vos, claro que sim. Farão o que vos disser?
- Naturalmente - disseram os jovens em uníssono.
O ancião, dirigindo-se ao jovem, disse:
- Vai às terras do norte, e ali encontrarás um pico que se destaca sobre os outros, e é a morada de formidáveis falcões. Apanha o mais poderoso, sem o magoares, e traz-mo.
Depois disse à jovem:
- Tu, minha boa amiga, deves dirigir-te às terras do sul e ali verás um pico que sobressai dos outros, e é a morada das mais belas e intrépidas águias. Apanha o maior exemplar e, sem o magoares, traz-mo.
Os jovens entrelaçaram-se num sentido e amoroso abraço, e depois cada um partiu na sua direcção. Foram semanas difíceis de separação, mas cada um deles conseguiu o melhor exemplar de cada espécie. Voltaram para o bosque onde vivia o velho sábio e mostraram-lhe o falcão e a águia.
- Agora - disse o ancião -, quero que atem o falcão e a águia pelas patas. Surpreendidos os jovens assim fizeram, sem entender as intenções do sábio. 
- Agora peço-vos que observem com muita atenção e que nunca esqueçam o que virem.
O falcão e a águia, com as patas atadas, tentaram voar, mas falharam a tentativa repetidamente. Depois de várias e inúteis tentativas, começaram a picar-se violentamente entre si. 
O ancião perguntou:
- Estão a perceber?
Fez-se um perfeito silêncio durante uns instantes e o sábio acrescentou:
- Nunca se esqueçam do que viram. Vocês são como um falcão e uma águia, mas se se atarem, em vez de darem um ao outro as asas da liberdade e se respeitarem, serão como estes magníficos exemplares, que não só não conseguem retomar o voo, como se querem destruir mutuamente. Para que o amor prevaleça terão de se amar muito, sim, mas sem nenhuma espécie de exigências e entraves.
Os dois jovens olharam para o ancião imensamente gratos, e depois olharam-se entre si, para a seguir se fundirem num intenso abraço, mas sabendo que se queriam que o seu amor perdurasse para toda a vida, era necessário «voarem» juntos, mas não presos um ao outro.

Não se trata de estar apenas apaixonado, mas sim de amar, e não só de amar, mas de saber exercer esse amor e cuidá-lo como o mais valioso dos tesouros, como a mais esplêndida das orquídeas. O verdadeiro amor não é para criar correntes, mas sim asas de liberdade; não é para limitar, mas sim para expandir. Quando se estabelecem limites e se liberta o sentimento de posse, então esse amor acaba por diminuir e gerar o desamor." - Ramiro Calle
  

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