quarta-feira, 25 de outubro de 2017





"O mundo antigo, em particular o mundo greco-romano, não acreditava nos ideais abstractos, longínquos e irrealizáveis. Suspeitava dos fanatismos. Desconfiava dos excessos sentimentais. Por isso dava tanta importância à amizade. Porque, na amizade, a distância entre o ideal e o real deve ser curta. Na amizade, não podemos apregoar uma coisa e fazer outra. Na amizade, os pactos são respeitados, a confiança é merecida. A amizade tem de ser leal, sincera, límpida. O amigo tem de querer o bem do amigo, não por palavras mas concretamente. Tem de estar presente no momento da necessidade. Quem é beneficiado não deve nem aproveitar-se nem maçar com agradecimentos. Na amizade não se pode enganar, não se pode fazer mal. Nunca, nem uma única vez. Na amizade, é preciso saber ver as qualidades do outro e valorizá-las. O amigo tem de ser aberto, cheio de vida, alegre. Não deve aborrecer, não deve ser maçador. Um amigo nem sequer deve ser demasiado generoso, não deve cumular o outro de ofertas, porque, se assim fizer, suscita a necessidade de retribuição, cria obrigações de gratidão que são demasiado pesadas. A amizade deve ser sempre fresca, leve, mesmo quando é heroica. A amizade diz sempre «não tem de quê». Esses são os ideais da amizade. Não pede que dê tudo, que se beijem os leprosos, que se minta em tribunal. Não pede sequer para viverdebaixo do mesmo tecto. Mas exige aquilo que quer. E, se não lhe for dado, julga e condena. Depois de condenar, muito dificilmente perdoa. Não castiga, não ameaça, não exerce represálias, não faz chantagem. Simplesmente, desvanece-se. Se as suas regras não são respeitadas, a amizade desaparece. Provavelmente, não há nenhuma outra relação humana em que o real tenha de estar sempre tão perto do ideal. É a relação que menos suporta o exagero e os mexericos. Compreendemos assim por que motivo a amizade parece tão frágil e porque há tanta gente que se diz desiludida com a amizade. Esses confundiram-na com qualquer outra coisa, não quiseram ter em conta as regras do jogo. Também estão errados os que dizem que havia amizade na antiguidade, mas que ela desapareceu no mundo moderno. A amizade existia nos tempos de Confúcio e existe nos dias de hoje. Não há qualquer motivo que nos leve a pensar que vai desaparecer no futuro." - Francesco Alberoni

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