quarta-feira, 4 de outubro de 2017





"Qualquer mudança, para ser profunda e duradoura, deve ser voluntária, porque, sendo forçada, não a tornamos nossa, não a retemos.

Em muitos lares de todo o mundo têm lugar cenas pedagógicas como esta:

A nossa mãe entra em casa e vê que deixámos as sapatilhas no meio da sala. Aborrece-se e diz-nos:

- Já te disse mil vezes que tens de deixar as tuas coisas arrumadas! Vai guardar imediatamente as sapatilhas na sapateira.

A pergunta é a seguinte: se obedecermos e as guardarmos no seu devido sítio, a nossa acção tem algum mérito? Não, o estrito cumprimento de uma ordem nunca o tem. Porque nenhuma acção forçada produz sensação de bem-estar, de domínio, de realização.

O máximo que uma criança pode fazer em semelhantes circunstâncias é obedecer; nunca transformar-se. O que significa que nunca reterá essa aprendizagem.

Eu recomendo sempre um modo diferente de educar:

- Filho, ouve o que te digo: guardar sempre as sapatilhas na sapateira tem as suas vantagens: a casa fica mais bonita e sabes sempre onde estão; assim não perdes tempo a procurá-las. É muito fácil uma pessoa habituar-se à arrumação! Tu és capaz de o fazer mas, se não o fizeres, não faz mal, porque eu o farei por ti. Seria fantástico que ganhasses esse hábito, mas não acontecerá nada de mal se assim não for.

Quando sugerimos a mudança desta maneira, isto é, de forma voluntária, pode suceder que a criança passe a pôr, ou não, as sapatilhas no devido lugar, mas, se o fizer, será para sempre, sem necessidade de repetir o conselho.

O ser humano interioriza facilmente hábitos que lhe proporcionam bem-estar, que o fazem sentir-se bem. Mas é preciso que esses hábitos decorram de acções voluntárias, dotadas de mérito, e que proporcionem um certo orgulho pessoal.

Nunca conheci um miúdo que resistisse à tentação de tentar fazer algo excepcionalmente bem. No dia em que arrumar - voluntariamente - as sapatilhas no sítio, a criança sentir-se-á esplêndida: mais madura, mais capaz, mais forte.

Se ensinarmos os mais novos desta maneira, seremos testemunhas de cenas tão divertidas como esta; chegará o dia em que a criança dirá ao seu irmão mais novo:

- Não sabes pôr as sapatilhas no sítio? Eu ensino-te: guardam-se na sapateira: assim a casa fica bonita e arrumada e, sempre que precisares delas, sabes onde as encontrar!

Esta criança terá incorporado a mudança no seu repertório de atributos e costumes para o resto da sua vida. Isto, sim, é um rico negócio!

Qualquer aquisição duradoura e valiosa tem de ser fruto do interesse, da curiosidade, da diversão e do mérito. Tudo o resto é um enorme desperdício de tempo e de energia: é má educação." - Rafael Santandreu

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