domingo, 2 de julho de 2017





"Uma das características das pessoas sãs e fortes é que se dedicam com paixão a tudo o que têm em mãos. Fazem-no, contudo, com lucidez. Sem receio. Desfrutam do seu trabalho e das suas paixões, do cuidado da sua saúde e da dos seus filhos, mas sem se preocuparem. Vivem a vida como se de um jogo se tratasse.

E isso só é possível porque têm muito presente, num plano filosófico, que o essencial é essencial e que tudo o resto são acréscimos sem importância. Sabem muito bem que o essencial é comer, beber e amar a vida e os demais. Desta forma, são capazes de empreender negócios, viagens, relações e todo o tipo de projectos com a atitude de um menino que joga à bola com os amigos. Se conseguirmos um determinado resultado, excelente. Se não o conseguirmos, excelente também. O importante é o processo, a diversão em cada momento.

O felicismo consiste em fazer aquilo que mais lhe agrada em cada momento da sua vida sem pensar demasiado no assunto. E, sobretudo, jogar ao jogo da vida sem o dotar dessa transcendência louca que hoje em dia impregna tudo o que fazemos.

É bom ter desejos, metas e objectivos. Todas as pessoas sãs, incluindo as crianças, sentem o impulso de empreender determinadas tarefas. Mas o mais lógico é que estes projectos sejam vividos como se de um jogo se tratasse.

Se partirmos do pressuposto de que, para sobreviver, as únicas coisas de que precisamos são comida e água, conclui-se que não é necessário fazer mais nada. Podemos trabalhar, esforçar-nos em múltiplas frentes e empresas, mas sempre tendo em consideração que tudo se trata de divertimento: nada que suponha o fim do mundo; nada que suponha o seu princípio!

É bom ter desejos, mas cuidado para não os tornarmos necessidades imperiosas porque esse é um defeito de fabrico do ser humano: transformar simples desejos em necessidades loucas a qualquer altura. Se nos habituamos a beber uma água de determinada marca todos os dias, é muito provável que passemos de dizer: «Adoro a Água da Serra da Estrela» para gritar: «Preciso de Água da Serra da Estrela! Senão não consigo apreciar a refeição!»

Assim é o ser humano. A filosofia budista refere-se a este fenómeno como o «apego», os psicólogos cognitivos, como «conversão de desejos em necessidades absolutas». Só quando aprendermos a não nos apegarmos às coisas nem às pessoas poderemos começar a desfrutar realmente delas." - Rafael Santandreu

Sem comentários:

Enviar um comentário