domingo, 29 de outubro de 2017





"Não acho que as paixões sejam o lado A da vida. Mas gosto delas. Gosto do lado ternurento das paixões. Do olhar que faísca. E da luz que trespassa por todos os gestos. Do «que foi que eu disse?!...» que se repete, num tom de protesto aconchegante. E do jeito de falar onde se comem as sílabas, se morde o lábio e se ri com os olhos. Tudo ao mesmo tempo. E gosto da indiferença, mais ou menos soberba, pelos dias da semana ou pelo tempo que faz. E da maneira, regalada, como (depois de jurarmos que nunca fomos supersticiosos) imaginamos que as coincidências nunca acontecem por acaso. Mas gosto, sobretudo, das mensagens, mais ou menos patetas, que se enviam. Daquelas que espreitamos, clandestinamente, numa reunião. E nos deixam sem jeito.

Gosto da maneira como, vindo lá de dentro, alguém fala d' «o meu amor» (fazendo de todos os seus sentimentos uma só... pessoa). E gosto dos diminutivos de quem se ama: «tatinha» ou «momô» por exemplo (que diminuem a distância entre dois corações ao mínimo daquilo que as sílabas permitem). Mas gosto, sobretudo, das mensagens patetas das paixões. Não sei se são patetas de verdade. Mas são adoráveis. E gosto delas. Mesmo daquelas em que, minutos antes de qualquer coisa mais ou menos insignificante, alguém nos diz: «gosto de ti!» ou «amo-te muito!» (que é uma forma de nos recordar que a sorte, ao pé da protecção duma paixão, é uma brincadeira de crianças)." - Eduardo Sá

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