segunda-feira, 31 de outubro de 2016




"A verdadeira coragem só pode acontecer perante o medo - se não tivermos receio, como podem os nossos actos ser corajosos?

Coragem, é essa a única maneira de se viver. A coragem não é verdadeiramente algo que se sinta. É algo que se mostra.

O que nos retém na vida é a invisível arquitectura do medo. É ela que nos mantém nas nossas zonas de conforto, que são, na verdade, os lugares menos seguros para se viver. Na realidade, o maior risco na vida é não assumir riscos. Mas de cada vez que fazemos aquilo que tememos, recuperamos o poder que o medo nos roubou - pois do outro lado do nosso medo reside a nossa força. Cada vez que entramos no desconforto do crescimento e do progresso, ficamos mais livres. Quanto mais medos atravessamos, mais poder recuperamos. Desta forma, tornamo-nos temerários e poderosos, e somos capazes de viver as vidas dos nossos sonhos." - Robin Sharma

domingo, 30 de outubro de 2016




"O que é que nos assusta tanto na morte?

O que nos mete medo, o que nos congela perante aquele momento, é a ideia de que naquele instante desaparecerá tudo aquilo a que nós estamos tão apegados.

Identificamo-nos com a identidade - jornalista, advogado, director de um banco - e a ideia que tudo isto desapareça, que deixemos de ser o grande jornalista, o bom director do banco, que a morte leve tudo isto, transtorna-nos. Nós possuímos a bicicleta, o automóvel, o belo quadro que comprámos com as poupanças de uma vida inteira, um campo, uma casinha na praia. É nossa! E agora morremos e perdemo-la. A razão porque temos tanto medo da morte é que com ela é preciso renunciar a tudo o que estávamos afeiçoados: propriedades, desejos, identidades. Eu já fiz isso. Nos últimos anos, dediquei-me a deitar ao mar tudo isto e agora já não há nada a que esteja apegado.

Isto porque, obviamente, nós não somos o nosso nome, nós não somos a nossa profissão, não somos a casinha de praia que temos. E se aprendermos a morrer enquanto vivemos, como bem nos ensinaram os sábios do passado - os sufis, os gregos, os nossos adorados rishis dos Himalaias -, então habituamo-nos a não nos reconhecermos nestas coisas, mas sim a reconhecermos o valor extremamente limitado, transitório, ridículo, impermanente. Se um dia comprámos uma casa na praia - vrumm, é levada pela maré! Se um filho, que foi meu por tanto tempo e a quem dediquei pensamentos, às vezes também sofrimentos e angústias, sai de casa, cai-lhe um tijolo em cima e - vrumm, acabou! Então percebemos que não é possível sermos aquelas coisas que tão simplesmente desaparecem.

E se, ao vivermos, começamos a perceber que não somos aquelas coisas, então, aos poucos, cansamo-nos e abandonamo-las. Abandonamos também o que nos parece mais precioso, como o amor que eu tenho pela tua mãe. Amei a tua mãe ao longo dos quarenta e sete anos que estivemos juntos e quando digo que estou cansado, não quero dizer que já não a amo, mas que este amor já não é uma escravidão; que já não estou dependente deste amor; que estou também desapegado dele. Este amor é parte da minha vida, mas eu não sou aquele amor.

Sou tantas outras coisas... ou talvez nada. Mas não sou aquilo. E a ideia de que ao morrer perco aquele amor, perco esta casa, perco-te a ti e à tua irmã, perco a minha identidade, já não me preocupa, não me mete nada medo, porque já me habituei. E para isto, os Himalaias, a solidão lá em cima, a natureza, o destino desta doença que me deu a oportunidade para reflectir sobre tudo isto foram grandes mestres.

Outra coisa que me parece fundamental na vida de um homem que cresce e que amadurece, como espero que me tenha acontecido, é a relação com os desejos. Os desejos são o nosso maior impulso. Se Colombo não tivesse desejado encontrar um novo caminho para as Índias, não teria descoberto a América. Todo o progresso, se quisermos chamar-lhe assim, ou o retrocesso, toda a civilização ou a incivilização do Homem, deve-se ao desejo. Desejo de qualquer tipo, desde o mais simples, o carnal, o desejo de possuir a carne de outra pessoa.

O desejo é um grande impulso, não o nego. É importante e determinou a História da humanidade. Mas se começarmos a ver bem, mais uma vez, o que são estes desejos, estes desejos dos quais nunca fugimos? Ainda por cima, nesta nossa sociedade de hoje que nos leva apenas a desejar e, no meio dos desejos, a escolher só os mais banais, os materiais, por outras palavras, os de supermercado. O desejo dessas escolhas é inútil, é banal, é irrisório.

O verdadeiro desejo, se alguém quiser um, é o de ser ele próprio. A única coisa que uma pessoa pode desejar é já não ter mais escolhas, porque a verdadeira escolha não é entre duas pastas de dentes, entre duas mulheres, entre dois carros. A verdadeira escolha é a de ser quem se é. Se nos habituarmos ou fizermos exercícios, se pensarmos, pensarmos!, apercebemo-nos de que aqueles desejos são uma forma de escravidão. Porque quanto mais desejamos, mais limitações criamos. Se desejarmos uma coisa a ponto de não pensarmos em mais nada, não fazemos mais nada, tornamo-nos escravos daquele desejo.

Então podemos, numa idade madura, mais adulta, começar a ver isto tudo... e desatamos a rir dos desejos que temos, a rir dos desejos que tivemos, a rir ao ver que estes desejos não servem para nada, que são efémeros como o tudo o resto na vida. Assim começamos a aprender a tirá-los, a tirá-los da frente. Incluindo o último desejo, comum a todos, o da longevidade. Uma pessoa diz: «Está bem, não quero mais dinheiro, não quero mais fama, não quero comprar mais nada; mas quero pelo menos um comprimido que me faça viver mais dez anos!»

Também já não tenho este desejo, é que não o tenho mesmo. 

Tenho sorte. Porque os anos de solidão naquela casinha nos Himalaias mostraram-me que não tinha nada para desejar. Precisava de um pouco de água para beber e estava ali na fonte, onde os animais bebiam. Comia um pouco de arroz e alguns legumes cozidos ao lume. Que outros desejos podia ter? Não o de ir ao cinema ver o último filme. Quero lá saber! O que muda na minha vida? Nada, a este ponto, nada. O que agora está à minha frente é talvez a coisa mais estranha, curiosa, nova que alguma vez me aconteceu.

Por isso digo que já não tenho vontade de estar nesta vida, porque esta vida já não me suscita curiosidade. Vi-a por fora e por dentro, vi-a por todos os lados, e os desejos que me poderia suscitar já não me interessam. Então a morte torna-se mesmo... a única coisa nova que me pode acontecer, porque nunca a vi, nunca a vivi. Só a vi nos outros." - Tiziano Terzani 

sexta-feira, 28 de outubro de 2016




"O Wabi Sabi é uma antiga arte japonesa que procura descobrir a beleza e a perfeição na imperfeição. O Wabi Sabi valoriza o que é imperfeito, impermanente e incompleto. Encontra a beleza em coisas modestas, humildes e não convencionais. 

O amor Wabi Sabi é a arte e a capacidade de amarmos as nossas imperfeições e as dos nossos parceiros. Não se trata de uma mera aceitação ou negação daquilo que nos incomoda ou irrita, mas sim de um profundo interesse pela singularidade do outro.

Vamos imaginar que se deparava com um vaso de metro e meio de altura e com uma enorme fissura no centro. É provável que se sentisse imediatamente tentado a considerar o vaso feio ou a encará-lo como um pedaço de lixo, não lhe dedicando mais nenhum segundo de atenção. Mas um praticante do Wabi Sabi colocaria o vaso num pedestal e valorizaria a história e a beleza da sua imperfeição dirigindo a luz de um projector directamente para a fissura.

À semelhança do que sucede com o vaso rachado, as fissuras são uma parte de nós que não pode ser alterada. O amor Wabi Sabi permite-nos amar e aceitar as nossas imperfeições e as dos nossos parceiros. É a beleza escondida que dança mesmo à frente dos nossos olhos, iluminando a nossa singularidade, fazendo apelo à nossa humanidade e estabelecendo laços entre nós." - Arielle Ford

quinta-feira, 27 de outubro de 2016




"A maior dádiva que podemos oferecer a nós próprios é o compromisso de vivermos a nossa vida de forma autêntica. Sermos verdadeiros para connosco, porém, não é tarefa fácil. Precisamos de nos afastar das seduções da sociedade e viver a vida à nossa própria maneira, seguindo os nossos próprios valores e alinhados com os nossos sonhos originais. Precisamos de aceder aos nossos eus ocultos; explorar as esperanças profundamente enraizadas e invisíveis, os desejos, forças e fraquezas que fazem com que sejamos quem somos. Temos de entender onde estivemos e saber para onde nos dirigimos. Cada decisão que tomamos, cada passo que damos, deve estar de acordo com o nosso compromisso em vivermos uma vida que seja verdadeira, honesta e autêntica para connosco, e apenas connosco. E à medida que vamos prosseguindo, podemos ter a certeza de experienciar a fortuna muito além do que poderíamos imaginar." - Robin Sharma

quarta-feira, 26 de outubro de 2016




"Uma parte importante da sabedoria e do conhecimento consiste em não querer transformar as pessoas naquilo que não são, mas sim em aceitar o que são, em compreender a sua experiência de vida.

Por que vamos querer que os homens sejam diferentes daquilo que são?

Qualquer civilização que começa a alimentar as pessoas pensando que elas são incapazes de tratarem de si próprias está condenada ao fracasso. Qualquer homem que não seja capaz de cuidar de si começa a morrer. Qualquer animal que não possa bastar-se a si próprio converte-se em presa de outro animal. Qualquer planta que não tenha força para chegar ao sol e à água, regressa à terra de onde saiu." - Fun Chang

terça-feira, 25 de outubro de 2016





"Cada coisa pode ser isto, ou cada coisa pode ser aquilo. Não podemos ver as coisas como outro as vê. Só se pode conhecer as coisas através do conhecimento de nós próprios. Por conseguinte, diz-se: Isto vem daquilo, e aquilo vem disto - o que na verdade significa que isto e aquilo se deram à luz um ao outro. A vida nasce da morte e a morte da vida. O que nos parece inapropriado só surge em função do que é apropriado. Só há o certo por causa do errado, e o errado por causa do certo. 
Ser constante é ser útil. Ser útil é compreender a verdadeira natureza própria de cada coisa. A compreensão da verdadeira natureza própria é a felicidade. Quando se alcança a felicidade, está-se perto da perfeição. Pára-se, embora não se saiba que se parou. Isto é o Tao." - Zhuang Zi

segunda-feira, 24 de outubro de 2016




"Uma das maiores prendas que podemos oferecer a nós próprios é vermo-nos livres das nossas desculpas. Rudyard Kipling escreveu em tempos: "Temos quarenta milhões de motivos para o fracasso, mas nem uma simples desculpa."

Afinal de contas, a própria vida é uma viagem, e o mais importante não é o que estamos a obter, mas sim em quem nos estamos a tornar." - Robin Sharma

domingo, 23 de outubro de 2016




"Deus das almas vagabundas, Deus fugido dos deuses, atende-me.

Tu, destino que proteges espíritos loucos e errantes como o meu, escuta-me.

Vivo no meio de uma raça de homens perfeitos.

Eu, o mais imperfeito de todos os homens.

Eu, um caos humano, uma nebulosa de confusão, movo-me entre mundos perfeitos, entre povos regidos por leis exemplares, que seguem uma ordem pura; de pensamentos catalogados, de sonhos ordenados, de visões inscritas e registadas.

As suas virtudes, meu Deus, estão mensuradas, os seus pecados estão calculados com peso e medida, e até os inumeráveis actos que acontecem no crepúsculo - o que não é pecado nem virtude - estão registados.

Aqui, os dias e as noites dividem-se em períodos exactos, e as estações são governadas por normas de precisão impecável. Comer, beber, dormir, vestir, e depois cansar-se. Tudo a seu tempo. Trabalhar, jogar, cantar, depois entregar-se ao descanso, tudo na hora que o relógio determina.

Pensar e sentir de modo definido e programado depois de pensar e sentir quando certa estrela sobe ao longínquo horizonte. Roubar o vizinho com um sorriso, dar uma prenda com gesto gracioso, louvar com prudência, censurar com cautela, destruir uma alma com uma só palavra, queimar um corpo com um sopro, e a seguir lavar as mãos uma vez cumprida a tarefa diária.

Amar de acordo com a ordem estabelecida, divertir-se segundo o que se combinou, adorar adequadamente os deuses, enganar o diabo com artifício e depois esquecer tudo como se a memória tivesse morrido. Imaginar com um fim determinado, projectar certas considerações, ser feliz com discrição, sofrer com nobreza, depois de esvaziar a taça para no dia seguinte poder enchê-la de novo. Todas estas coisas, meu Deus, estão concebidas com precisão, criadas pela vontade, mantidas com cuidado, governadas com regras, dirigidas pela razão e depois mortas e enterradas. E até os seus túmulos salientes que moram na alma humana têm cada um o seu número e a sua marca.

É um mundo perfeito, um mundo de excelência consumada, um mundo de coisas supremas e maravilhosas. O fruto mais maduro do Paraíso, o pensamento que rege o universo.

Mas, porque tenho eu de viver nele, meu Deus?

Eu que sou a imatura semente de uma paixão insatisfeita, louco vendaval que não vai para Oriente, nem para Ocidente, fragmento aturdido de um planeta que sucumbiu envolto em chamas.

Porque estou eu aqui?, meu Deus." - Khalil Gibran

sábado, 22 de outubro de 2016




"Mas a verdade é que a nossa capacidade de descobrirmos felicidade em bens estéticos ou materiais parece depender decisivamente da satisfação preliminar de um repertório de necessidades afectivas e psíquicas primeiras, entre as quais se incluem a necessidade de compreensão, de amor, de comunicação e de respeito. Não nos será dado gozar - não somos capazes de gozar - do esplendor de jardins tropicais nem do encanto de uma deliciosa construção de madeira na praia, quando, bruscamente, a incompreensão e o ressentimento devastam uma nossa relação íntima." - Alain de Botton

sexta-feira, 21 de outubro de 2016




"Existe uma cortesia sem forma exterior: é a atenção.

Existe uma tristeza sem vestes de luto: é a aflição.

Existe uma música sem sons: é a alegria.

Existe uma confiança que não depende de palavras, um respeito que não é provocado por acções, uma bondade que não precisa primeiro fazer o bem: é a intenção.

Tocado com ira, o som do sino é guerreiro; tocado na tristeza, ele soa melancólico. Quando muda a intenção, muda também o som. Se, pois, uma verdadeira intenção influencia de tal forma o próprio metal e a pedra, quanto mais as pessoas." - Confúcio

quinta-feira, 20 de outubro de 2016




"Acredito que a nossa felicidade precisa que sejamos parte activa dela. Além disso, também penso que, dada a importância da recompensa, a felicidade merece o nosso esforço. 

Contudo, também penso que uma felicidade perfeita e que dure a vida inteira, em todos os momentos da vida, é impossível. Tê-lo compreendido e aceitado faz com que se deixe de perseguir a felicidade quimérica e contribui para que possamos desfrutar da felicidade real, ou seja, dos muitos momentos felizes que a vida nos pode oferecer. E apesar da felicidade dos contos de fadas ser impossível de alcançar (por não existir), o que podemos conseguir é ter a menor quantidade possível de mal-estares, dado que somos nós próprios quem criamos a maior parte deles com a nossa percepção errada das coisas. E também por causa deste mau hábito, que parece fazer parte da natureza de muitos de nós, de matutar constantemente, de dar demasiadas voltas ao assunto. Os nossos instintos primitivos fazem com que estejamos tão habituados às situações de ansiedade que não nos podemos desprender delas assim que essas situações passam. Precisamos de aprender a libertar-nos dessa ansiedade residual desnecessária. Alguém disse em tempos algo como «a pessoa sensata só pensa nas suas dificuldades se isso se lhe servir para alguma coisa. Caso contrário, pensa noutra coisa»." - Clemente García Novella

quarta-feira, 19 de outubro de 2016




"Se as nossas vidas são dominadas pela busca da felicidade, talvez poucas actividades sejam tão elucidativas no que à dinâmica dessa busca - com todo o seu ardor e paradoxos - se refere como as nossas viagens. Ainda que inarticuladamente, expressam uma inteligência do que viver deveria na sua essência significar, à margem das imposições do trabalho e da luta pela sobrevivência. E contudo é raro que as consideremos como ocasião de problemas filosóficos - quer dizer, como questões que requerem que as pensemos para além do horizonte da utilidade imediata. Vivemos afogados em conselhos que nos prescrevem os lugares até onde deveríamos viajar; mas muito pouco nos é dito sobre o porquê e o como de viajarmos - embora a arte da viagem parece dar espontaneamente azo a um certo número de questões, que não são nem demasiado simples nem demasiado triviais, e cuja ponderação poderá constituir uma modesta contribuição para o entendimento daquilo a que os filósofos gregos tão maravilhosamente chamaram eudaimonia ou plenitude humana." - Alan de Botton 

terça-feira, 18 de outubro de 2016




"Quando na nossa vida quotidiana somos bons e honestos, repletos de amor, de cuidado e cura, e menos egoístas, isso acabará naturalmente por levar-nos ao nirvana. Mas quando, pelo contrário, falamos e filosofamos sobre o nirvana sem nos incomodarmos com a prática diária, é possível que cheguemos a um nirvana estranho, mas que com certeza não é o autêntico, por lhe faltar a prática. Temos que executar estas valiosas doutrinas na nossa vida diária. Quer se acredite em Deus quer não se creia, quer se acredite em Buda ou não, quer como budista se acredite ou não acredite na reencarnação, não é isto o que mais importa. As pessoas devem ter uma vida proveitosa. E uma vida proveitosa não consiste simplesmente em boas comidas, belas roupas e uma casa confortável. Isto só não chega! O que precisamos é de uma boa motivação: dedicação libertadora sem dogmatismos, sem complicações filosóficas; simplesmente compreendendo que os outros também são nossos irmãos e irmãs, e respeitando os seus direitos, bem como a sua dignidade humana. O facto de nós, seres humanos, podermos ajudar-nos mutuamente é uma das nossas capacidades únicas. Temos que participar do sofrimento das outras pessoas. Mesmo que não se possa ajudá-las com dinheiro, mesmo assim é válido expressar no mínimo a nossa participação, apoio moral e simpatia. Esta deveria ser a nossa base de acção na vida. Se chamamos a isto religião ou não, não é o que mais importa." - Dalai Lama

segunda-feira, 17 de outubro de 2016




"Interpretemos o mundo que nos rodeia e as coisas que nele acontecem. É inevitável: todas as coisas agradáveis e desagradáveis que sentimos passaram antes pelo filtro dos nossos pensamentos, da nossa maneira de interpretar o que vemos, o que ouvimos... e do que acreditamos ver e ouvir. Contudo, apesar de não nos darmos conta, muitas vezes os nossos pensamentos não correspondem à realidade.
Às vezes - tantas vezes - as coisas não são aquilo que parecem. Não são tal como as interpretamos, por muito evidente que a explicação mais fácil nos pareça, à primeira vista, ser a verdadeira." - Clemente Garcia Novella

domingo, 16 de outubro de 2016




"Diz-se que quando nascemos, já trazemos um destino traçado, mas como o desconhecemos, muitas vezes enveredamos por caminhos errados e fazemos más escolhas!... A verdade é que, independentemente daquilo que estiver destinado no nosso percurso de vida, nós só valorizamos o bom se já conhecermos o mau e vice-versa!...
Como tudo na vida tem os dois lados, cabe-nos a difícil tarefa de sermos capazes de retirar as lições que ela nos dá para aumentar a nossa sabedoria e o nosso crescimento espiritual até compreendermos que a nossa missão nesta vida não é alimentar revolta ou vingança, mas sim transformar ódio e medo em Amor e Confiança. Tarefa bem difícil de concretizar quando vivemos num mundo em que quase todos querem ouvir: Mata!... Esfola!... Enquanto assim for, caminharemos a passo de caracol...
Mas não podemos perder a coragem! Pois os caracóis mesmo demorando mais tempo, também chegarão ao seu destino...
Se rejeitarmos sempre novos conceitos... novos caminhos... como poderemos evoluir?...
Como podemos acompanhar a transformação global que já se faz sentir?...
Cito algumas palavras do Sábio Dalai Lama numa das suas conferências:

"Na nossa vida vamos agarrando e estudando várias teorias que ao longo de anos de estudo temos que deixar fugir para agarrar outras! Tudo vai evoluindo e o que hoje consideramos certo daqui a uns anos já estará ultrapassado e é por isso que não podemos parar os nossos estudos." 

Ele tem razão. Nós temos que nos esforçar por acompanhar a evolução!
Tudo o que ajuda sem prejudicar ninguém é precioso para aumentar o nosso conhecimento e logicamente a nossa evolução a todos os níveis. 
Penso que da mesma forma que se foi construindo o egoísmo na humanidade, também podemos aumentar o potencial de todos para a justiça e a humildade. Leva mais tempo... mas se marcarmos a diferença, alguns se irão juntando a nós e atrás desses outros virão." - Maria Emília

sábado, 15 de outubro de 2016




"Relaxar é um desses prazeres simples da vida que, além de necessário, faz bem a todos. Em contrapartida, essa febre que assola muitos para conseguirem mais riqueza, será realmente agradável? Por outro lado, de certeza que essa ânsia em possuir mais coisas tem como objectivo o poder descansar calmamente um dia? Tenho as minhas dúvidas. Parece-me que os desejos de bens materiais chamam mais desejos de bens materiais, em geral supérfluos, numa espécie de cadeia que não tem fim. E, contudo, como Horácio deixou escrito, «se o teu ventre, os teus pulmões e os teus pés estiverem bem, as riquezas de um rei nada de valor poderão acrescentar». 
As pessoas que não sabem ou não querem aprender a desfrutar das pequenas coisas, do muito e bom que certamente têm, nunca serão felizes, mesmo que se tornem donas do mundo. A miséria não é uma causa de infelicidade tão habitual como a avareza, avareza de riquezas ou de honras. É fácil olharmos à nossa volta e vermos como a busca insaciável de ambas as coisas - riquezas e honras -, ou só de uma delas, acaba por fazer com que muita gente seja infeliz, se sinta mal constantemente, sinta uma tristeza infinita provocada não se sabe bem porquê.
Penso que os prazeres simples são o melhor antídoto que existe para esta sensação - que nos pode invadir a todos de vez em quando -, esta sensação de vazio, apatia, sem vontade de viver, de what's the point?, como se diria em inglês. A maioria de nós já se sentiu alguma vez, por causa dos efeitos da tristeza, com vontade de se afastar de qualquer coisa que lhe seja desagradável, das relações sociais, dos pequenos prazeres da vida. Com vontade de se afastar deles para se ir esconder num lugar escuro e ceder o seu lugar no mundo a outros. Penso que a melhor maneira de evitar essa tristeza é obrigarmo-nos a experimentar todas essas pequenas coisas de que sabemos que gostamos. E também a descobrir outras novas, porque não?
Como podemos encontrar prazeres autênticos? Procurando a beleza. Procurando gestos bonitos. Regozijando-nos sempre que vemos comportamentos nobres. Porque onde encontrarmos a beleza, estaremos a encontrar sensações agradáveis. E se, com a nossa atitude, procurarmos acrescentar um pouco de beleza à que já existe, conseguiremos multiplicar o seu efeito balsâmico. 
Contemplar algumas vacas a pastar ou cavalos a galopar, ou - também não precisamos de ser tão poéticos - apenas o nosso cão a dormir a sesta. Um punhado de cerejas. O céu completamente limpo. Ou todo coberto de nuvens, mas um céu. Um simples gole de água quando se tem sede. O sabor que dá o lume lento. Inspirar fundo o cheiro de uma flor. Amar como se nunca alguém nos tivesse magoado. Cantar como se ninguém pudesse ouvir se o fazemos bem ou mal. Qualquer destas coisas - e tantas outras - podem proporcionar-nos um prazer duradouro, uma felicidade que nos acompanhe por muito tempo. E, ao longo de cada dia, não temos mil e uma oportunidades para encontrarmos alguma destas coisas?
É frequente uma pessoa invejar outras por coisas nas vidas delas que lhe parecem exóticas ou sugestivas. Penso que aquilo que é digno de invejar nalgumas pessoas é, sim, essa espécie de receptibilidade, essa sensibilidade que faz com que, descritas por elas, tantas coisas pequenas e aparentemente sem importância, acabem por nos parecer fascinantes. 
Na minha opinião, outro dos grandes prazeres da vida é aprender. Se conseguirmos ampliar o nosso conceito de interessante; se somos capazes de fazer com que tudo o que vemos à nossa volta tenha algo que nos atrai, que queiramos conhecer; se sabemos descobrir a parte instrutiva de qualquer situação que presenciemos; se estudamos tudo com entusiasmo de vermos confirmadas - ou desfeitas - algumas das nossas opiniões; se conseguirmos experimentar tudo com o espírito de um botânico entre as plantas, ou de um zoólogo entre os animais, incluindo-nos na observação de nós mesmos, aproveitaremos muito mais a vida. Quando uma pessoa está a aprender algo que deseja saber, é quase impossível que se sinta tensa ou infeliz. Pessoalmente, prometi a mim mesmo não deixar de sentir curiosidade enquanto viver. Prometi a mim mesmo não deixar de me esforçar, seja qual for a minha idade, para continuar a aprender.
Como forma de elogio às coisas simples, cito as palavras belíssimas de Samuel Taylor Coleridge, o poeta romântico. Dizia ele que, apesar de muito frequentemente não nos apercebermos, «a felicidade da vida é composta por fracções de um minuto, das bondades depressa esquecidas de um beijo ou de um sorriso, de uns olhares amáveis, de uma cumplicidade vinda do coração e de todas essas incontáveis pequenas coisas que enchem os nossos momentos de sensações agradáveis»." - Clemente Garcia Novella

sexta-feira, 14 de outubro de 2016




"As pessoas não gostam de mudanças. Têm medo da rejeição!...

Como podemos estagnar a nossa inteligência ao ponto de sermos forçados a regermo-nos por velhos preconceitos?... Não consigo compreender por que razão, em pleno século vinte e um, ainda não se sabe respeitar as diferenças. Parece que não querem evoluir!... Será que ninguém compreende que é a diferença que nos tem feito avançar na escala da evolução e que é com o respeito e o debate sobre os vários caminhos que podemos chegar a algumas soluções?... Lá porque uma pessoa gosta de comida quente e outra de comida fria, não quer dizer que não saibam ambas apreciar um saboroso prato de comida!" - Maria Emília

quinta-feira, 13 de outubro de 2016




"Uma boa parte da nossa felicidade baseia-se em que, nas nossas vidas, exista a proporção certa entre a preocupação que dedicamos ao futuro (Woody Allen disse uma vez: «Interessa-me muito o futuro porque é onde vou viver o resto da minha vida») e a capacidade que temos de aproveitar o presente. Se essa proporção não for a adequada, provavelmente estaremos a inquietar-nos em excesso com situações que ainda não aconteceram, fazendo com que os nossos medos por antecipação nos estraguem o presente, ou então estaremos a comportar-nos como imprudentes por não planearmos o necessário.
Todos, nalgum momento das nossas vidas, cometemos um desses dois erros. Em certas ocasiões vamos com impaciência ao encontro das coisas que queremos que aconteçam, como se apenas estas nos pudessem fazer felizes, deixando que o presente nos passe ao lado, sem desfrutarmos dele. Penso que, dos dois, este é o erro mais habitual. Mas é verdade que noutros momentos agimos sem toda a premeditação necessária.
Os clássicos pensavam que, para sermos felizes, a placidez do presente só deveria ser perturbada por problemas que temos a certeza que vão ocorrer e que sabemos em que momento vão ter lugar. Se não planificássemos o necessário perante este tipo de situações, então, aí sim, estávamos a pecar por sermos irresponsáveis. Contudo, se pretendemos ter tudo programado e debaixo do nosso controlo - algo de todo impossível -, não teremos nem um momento de calma.
Apenas o presente é garantido e, contudo, nem sempre desfrutamos dele.
Uma boa maneira de aprendermos a fazê-lo é observar as crianças. Elas dão-nos uma grande lição. Uma das melhores coisas da paternidade é apercebermo-nos das coisas que os nossos filhos nos podem ensinar. Aqueles que os tiverem, observem como desfrutam de cada instante por puro prazer, sem ansiedades auto-impostas, sem mais nada. Epícteto soube explicá-lo muito bem: «O que fazem as crianças? Constroem castelos com pedras ou com areia, apesar de saberem que logo a seguir os vão derrubar. Nunca lhes falta entretenimento. E será que nós não podemos fazer o mesmo que as crianças fazem naturalmente, sendo que além disso temos o uso da razão e da experiência? Em todo o lado nós, os adultos, temos pedras e areia [...] e também temos, dentro de nós, muito por construir.»
Penso que este é um dos segredos da felicidade: cultivar a capacidade de nos entusiasmarmos com qualquer areia ou pedra, a capacidade de nos deslumbrarmos até com as coisas aparentemente mais pequenas do momento presente. As pessoas que têm esta capacidade de forma natural são as que mais desfrutam da vida. Pois bem, tenho boas notícias: este é um talento que se pode adquirir.
Procuremos absorver todos os pormenores de cada bom momento.
De cada cor, de cada cheiro, de cada sabor, de cada nuance de cor, cheiro e sabor; de cada objecto, de cada sensação, de cada pessoa presente. É um prazer que podemos repetir as vezes que quisermos: não precisamos de nada para o desfrutarmos, salvo a atitude correcta, a qual depende apenas de nós. E não podemos perder de vista que, às vezes, as coisas que nos acontecem são como canções em línguas que não conhecemos bem: não as compreendemos, mas gostamos delas. Muito bem, porque não aproveitá-las apenas, deixando por uma vez de lado o nosso desejo instintivo de racionalizar tudo?
Todos sabemos que, mais cedo ou mais tarde, a morte chegará. Mas enquanto a esperamos, aproveitemos. E ao aproveitarmos, enganamo-la. Há uma frase que, apesar de já todos a termos ouvido perante a morte de alguém jovem, é muito enganadora. Trata-se de: «tinha o futuro todo pela frente». Ora bem, não é verdade. Não se pode perder o que não se tem. Nunca ninguém tem todo o futuro pela frente. 
A única coisa que possuímos de verdade, a única coisa com que podemos contar, a única coisa que ninguém nos pode tirar, nem sequer o destino, é o momento presente.
Embora tenhamos dificuldade em ver a realidade tal como é, aquele que morre jovem, na verdade, perde o mesmo que alguém que já viveu muitos anos: de novo, o presente.
De modo que, dado que este momento presente ninguém nos pode tirar, façamos todo o possível para o aproveitar. Sem que aproveitar equivalha a batalhar por prazeres refinados. Os prazeres mais simples são aqueles que realmente nos trazem felicidade." - Clemente Garcia Novella 

quarta-feira, 12 de outubro de 2016




"Eis que toca o telemóvel... fazendo-me estremecer...

Apresso-me a atender e fico feliz! Como é bom ouvir a tua voz... matar saudades, sentindo o carinho no som das tuas palavras...

O amor faz verdadeiros milagres! É a energia que tem a capacidade de nos motivar para tudo e isto para mim faz todo o sentido! Basta pensar que (salvo algumas excepções) todos somos fruto do amor. Por isso mesmo, precisamos tanto dele que o vamos procurando sempre pela vida fora, nas mais variadas situações: amor por nós próprios... amor pelos outros... amor pelas coisas que fazemos! Há em todos nós uma necessidade enorme de amar e de nos sentirmos amados... Sem amor... sem carinho... ficamos vazios e parece que tudo deixa de fazer sentido... porquê?... Porque nos falta parte da nossa verdadeira essência." - Maria Emília

terça-feira, 11 de outubro de 2016




"E a verdade é que aquilo que vulgarmente se admite como realidade não passa de ilusão, o que se julga conhecimento é muitas vezes apenas ignorância e o que se considera uma vitória talvez acabe por se revelar uma derrota. Tomar consciência de que a vida é um sonho, mas que este mundo pode estar repleto de verdade e beleza, eis algo em que vale a pena reflectir." - Takuan Soho

segunda-feira, 10 de outubro de 2016




"Não são precisas grandes coisas para uma pessoa se mostrar amável. A amabilidade reflecte-se nas coisas simples, que se fazem e dizem sem qualquer motivo em especial: «queres que te traga alguma coisa para beber?», «posso fazer alguma coisa por ti?», «estás cansado?», «o que fizeste é fantástico, admiro-te...»    
Imaginemos cenas amáveis. Lembremo-nos de encontros com pessoas amáveis.
Tenhamos pensamentos amáveis.
Adivinhem o que nos estaremos induzindo a sentir: amabilidade e com ela, paz. E se alguém não tem um sorriso - coitado -, ofereçamos-lhes nós um.
Uma maneira de ser amável com outra pessoa pode ser, simplesmente, mudar de assunto. Saber quando o fazer é uma aptidão social que muitas pessoas felizes possuem. Exercitemos esta habilidade. E sempre que nos sentirmos aborrecidos com alguém e isso nos impedir de sermos amáveis, podemos lembrar-nos das palavras de Marco Aurélio: «Quando estiver irritado por causa do erro de alguém, pense nas faltas semelhantes que, de vez em quando, também comete.»
Pode parecer-lhes um gesto insignificante, sem importância, mas desde há alguns anos - desde que vi como uma ex-colega de trabalho fazia sempre - procuro dizer «tenha um bom dia», ou alguma expressão semelhante, como forma de despedida nessas relações breves e ocasionais que se estabelecem com as pessoas que nos atendem nas bilheteiras do cinema, atrás de um balcão de um café, na caixa de uma loja ou num posto de informações de qualquer tipo. 
Diz muito pouco de nós, os clientes, enquanto seres humanos, diz muito pouco do nosso grau de cortesia, da nossa benevolência, a atitude de surpresa que a maior parte das pessoas que trabalham no atendimento ao público mostram quando recebem um sincero desejo de despedida, em vez de um simples e frio «bom dia» ou, o que ainda é pior, a despedida sem palavras, a que já estão habituadas. Depois da estranheza inicial, a maioria responde com um grande sorriso e um «igualmente». Pelos vistos, o comportamento mais habitual é que, se não vamos obter nada de uma pessoa, não nos damos sequer ao trabalho de sermos minimamente agradáveis. Não vemos razão para fazer algo de modo desinteressado.
Como disse William Penn: «Só espero passar por esta vida uma vez. Por isso, se houver algum gesto amável que possa mostrar, ou qualquer coisa boa que possa fazer por algum dos meus semelhantes, deixem-me fazê-lo agora, e não me peçam para a deixar de fazer ou a adiar, porque nunca mais voltarei a passar por aqui.»" - Clemente Garcia Novella

domingo, 9 de outubro de 2016




"Não sei o que nos espera no fim da curva. Estou tão assustada como as outras pessoas, e já a sofrer: o fim da Natureza e da biodiversidade, da segurança e do privilégio de viajar; temos perdas para chorar muito maiores do que o fim das carrinhas desportivas tal como as conhecemos. Podemos estar já a olhar para o fim do mundo, da forma que menos esperamos. Seria uma pura e informal ironia da História se o mesmo germe da varíola, que foi deixado à solta neste continente há duzentos anos com a chegada dos europeus, e que matou rapidamente cerca de 98 por cento da população americana indígena, nos voltasse a visitar com os mesmos resultados. Não parece ser seguro afirmar que nunca iremos saber a moral da nossa história.
O que posso dizer com certeza é que muitas coisas irão mudar para nós, e muito em breve. Construímos o nosso império sobre a presunção da infinidade de certos recursos, que agora nos estão a acabar: mais florestas, mais petróleo facilmente explorado, mais crescimento económico baseado em mercados inexplorados para os nossos produtos. Infelizmente, os nómadas da província de Lorestan podem já estar a comprar tanta Coca-Cola como que alguma vez serão induzidos a querer. «Em breve chegará a época», escreve Wendell Berry, grande profeta da nossa era, «em que não seremos capazes de recordar os horrores do 11 de Setembro sem recordarmos também o inquestionável optimismo tecnológico e económico que terminou nesse dia. Este optimismo assentava na proposição de que estávamos a viver numa 'nova ordem mundial' e numa 'nova economia' que 'cresceria' cada vez mais, trazendo uma prosperidade na qual cada novo incremento 'não teria precedentes'»
Cada vez que leio um argumento a justificar mais perfurações de petróleo em lugares sensíveis, reparo que começa com a advertência «A menos que os americanos estejam dispostos a aceitar uma mudança drástica de estilo de vida». Como se essa fosse a única coisa que nunca poderia acontecer. Como se muitos novos tipos de escassez não estivessem já na alfândega, com chegada marcada, ponto final, para antes de as minhas filhas chegarem à minha idade. Os cientistas têm tentado recordar-nos amavelmente de que o «fóssil» no combustível fóssil não é uma metáfora nem uma comparação. Esse petróleo vai acabar por secar, e nenhum vudu político pode induzir dinossauros ou florestas de fetos pré-históricas a deitarem-se e a apertarem-se para produzirem mais líquido para nós no período de tempo que precisamos. 
Isto já estava escrito há alguns anos, mas nós somos uma nação iletrada no que respeita a ler o que está escrito. Cada vez há mais coisas escritas. Alguma coisa irá eventualmente acabar com a encantadora e enfurecedora ingenuidade dos americanos que nos permite o nosso animado consumo e alegre ignorância da secreta fealdade que nos traz o que queremos. Não estou a dizer que sou a favor da queda; ela aterroriza-me. Estou a dizer que quando o urso de 400 quilos percorre todo o caminho até à última ponta do galho, alguma coisa vai partir-se. A nostalgia por uma ignorância mais antiga não é o cerne desta discussão. Estarmos aqui sentados a comer o mais depressa que conseguimos, enquanto olhamos em volta para o instrumento do nosso fim, também não o é. Esse instrumento poderia ser uma reconstrução guiada pela nossa própria previsão e disciplina, em vez de o ser pelo ódio de outra pessoa qualquer.
Entrar na guerra faz parte da natureza humana, dizem, e é a única maneira de estabelecer uma escassez de recursos. Não acredito. Existe a abordagem aventureira de Jasão contra os guerreiros dos dentes de dragão, e existe a abordagem mais intuitiva de Medeia, e ambas - para que conste - são humanas. Quando começou o mais recente ciclo de bombardeamentos, eu e a minha mãe afirmámos uma à outra: «Quando as dificuldades apertam, parece que os homens vão buscar uma arma e as mulheres procuram na despensa.» Ligeiramente mais de metade de nós aqui em baixo na Terra somos da persuasão da despensa, e não chegámos todos aqui por sermos eficazes assassinos. Por aqui refiro-me a encarregues do lugar, numerando biliões e vingando a nossa vontade no planeta. Chegámos aqui por sermos animais sociais, animais comunicativos, animais cooperativos, animais bípedes, utilizadores de ferramentas, poupadores de sementes, selectores de companheiros reservados, detentores de vida, jovens de grande cérebro que parecem determinados a suplantar a geração dos seus pais, e muitas vezes conseguem-no. Somos um animal demasiado esperto, parece-me a mim, para nos matarmos agora.
Eu fui feita para isto, para me sentar aqui nesta ponta aguçada e serrilhada entre dois séculos quando tanto de tudo se equilibra na balança. Posso escolher entre deixar tudo pendurado ou aguentar, e eu aguento porque nasci para o fazer, como todas as outras pessoas. Insisto que posso fazer alguma coisa certa se tentar. Insista também você em como também o pode fazer, em que, na verdade, já o está a fazer, e há muito mais de onde este veio. 
Essa maneira de pensar não parece ser a moda neste ponto aguçado e serrilhado do tempo, em que o poder é poderoso e a moda é a frieza e a escuridão e a desconfiança. Mas, ainda assim, suspeito que o mais profundo de todos os desejos humanos, lá em baixo no chão da alma, debaixo dos tapetes dispersos de luxúria e sede e fome, é o desejo de encaixe de se ser compreendido. E a vida é um trilho lento pelo caminho que se dirige ao reconhecimento de que esse desejo não vai ser cumprido. É esse o curso de toda a sabedoria: outros verão a frente e as costas, mas é cá dentro que todos vivemos, naquele lar em que baterá sempre apenas um coração. Aí temos de fazer as pazes com tudo o que precisamos de sofrimento, e com tudo o que alguma vez poderemos conhecer de divino, seja qual for o nome que lhe dermos.
O que consigo encontrar é isto, e assim tem de ser: conquistar o meu próprio desespero fazendo o pouco que posso. Roubar a trovoada e metê-la no bolso para a guardar para a longa seca. Sonhar na cor verde, saboreando o fim do perigo. Não me peçam provas. A possibilidade de um futuro melhor, a existência de Deus - são apenas duas de muitas coisas que caíram na categoria que eu rotularia como «impossível de provar, e a prova não é o que interessa». A fé tem uma vida própria. 
Talvez os pessimistas estejam no topo do jogo, e talvez não estejam. Talvez não custe nada ter esperança, e nós que a temos talvez sejamos capazes de ter vidas melhores e mais honestas como crentes do que teríamos como pessimistas. Talvez Deus seja apenas um tipo no autocarro. Talvez sejam realmente as colheres de pau da sua mulher aquelas que estão ali penduradas na latada do meu jardim, à espera de me distribuírem um pouco de graça no dia em que precisar dela. Talvez a vida não melhore mais do que isto, nem piore mais, e aquilo que temos é apenas o que estamos dispostos a encontrar: pequenos milagres, onde eles aparecem." - Barbara Kingsolver

sábado, 8 de outubro de 2016




"São muitas as vezes nas nossas vidas em que agimos com coragem. Tantas lutas no dia-a-dia de uma série de pessoas são uma manifestação permanente de coragem. Por outro lado, todos sabemos evitar coisas que não são do nosso agrado. Contudo, além de lutarmos heroicamente contra os problemas ou de nos esquivarmos deles com astúcia, ignoramos muitas vezes que existe e está ao nosso alcance uma terceira opção: a de aceitar. Talvez não gostemos tanto como das outras opções, mas com muita frequência é a nossa única alternativa. Uma alternativa de que nos costumamos esquecer. 
Aceitar não significa conformar-se e não fazer nada, mesmo se acredita que pode fazer alguma coisa para que a situação mude para melhor.
Aceitar significa não conceder a qualquer acontecimento o poder de nos magoar, de nos exaltar em excesso, de nos fazer infeliz. É verdade que a aceitação serena não é uma solução tão boa como a de conseguir mudar aquilo de que não gostamos, ou a de evitar situações que nos aborrecem, mas sempre é melhor do que essa reacção tão habitual e tão humana: choramingar em voz alta ou para nós mesmos, lamentarmo-nos amargamente e dar personalidade própria ao mundo, transformando-o num ser malévolo cujo principal objectivo é ensombrar-nos a vida, o que não é verdade porque o mundo e as suas coisas não são nem benevolentes nem maliciosas para nós: para o universo, nós somos indiferentes.
A aceitação consiste, sobretudo, em eliminar das nossas vidas a amargura, a tristeza, as lágrimas, o espernear infantil, a gesticulação mental... tudo atitudes que costumam acompanhar a nossa vivência das coisas quotidianas. Se não gostamos de alguma coisa devemos agir para mudar isso, se vemos que tal é possível, mas não devemos acrescentar à nossa sensação pensamentos do tipo: «porque acontecem ou porque existem estas coisas tão injustas no mundo?» ou «porque é que isto tem que me acontecer?»
A aceitação consistiria também em não tentarmos a todo o custo que as coisas aconteçam como nós queremos, mas aceitarmos qualquer das coisas que possam acontecer. Também seria bom que não esquecêssemos que, por vezes, há que saber simplesmente ranger os dentes, cerrar os punhos e esperar: as coisas mudam. Às vezes, para poderem ver melhor, os olhos precisam de lágrimas. «Confia no tempo, que costuma dar doces saídas a muitas amargas dificuldades.» escreveu Cervantes.
É verdade que muito frequentemente não podemos escolher entre encontrarmo-nos ou não numa determinada situação, mas o que temos, sim, é capacidade de tolerá-la. Desse modo, recuperamos uma parte do controlo, tirando poder ao destino. Costumamos aborrecer-nos com as coisas e os acontecimentos, sem pararmos para pensar sobre algo que, em teoria, deveríamos ter plena consciência: aos acontecimentos e às coisas é-lhes indiferente que estejamos muito aborrecidos, preocupados ou acabrunhados. Tal como, por muito que tentemos, é impossível controlar tudo o que acontece no mundo exterior, procuremos então controlar, sim, aquilo que podemos: os nossos pensamentos e reacções sobre as coisas que se passam nesse mundo.
Outra das coisas que temos de aprender a aceitar, além dos pequenos contratempos da vida, é o nosso passado. Recordar com insistência, vezes sem conta, coisas que nos aconteceram e que não gostámos, não é muito positivo. Impede-nos de avançar. E há outro problema: a memória está longe de ser perfeita; talvez aquilo de que uma pessoa se lembra não coincida com o que realmente se passou. A memória é uma grande fonte de erros. De modo que, às vezes, resistimos a aceitar algo que, na verdade, nem sequer sucedeu. É uma loucura. Já para não falar de que, por mais voltas que dermos, não se pode mudar o passado. 
«Há algo que nem os deuses conseguem», dizia Aristóteles, «desfazer o que já foi feito».
Todos temos de ser capazes de virar as costas a esses erros, problemas e acontecimentos do passado que desejaríamos (sem que isso seja possível) apagar. Se queremos ser felizes, não nos podemos dar ao luxo de arrastarmos esses erros connosco durante anos.
Aceitar... À medida que vejo passar os anos, mais me parece que a felicidade ou infelicidade dos seres humanos depende, sobretudo, da nossa boa disposição para aceitarmos aquelas coisas que não podemos mudar por não dependerem de nós." - Clemente García Novella

sexta-feira, 7 de outubro de 2016




"Há os que fazem mas não dizem e os que dizem mas não fazem. Para amar é preciso fazer e dizer. É este o grande segredo do amor. O bater de um coração nunca é silencioso." - Álex Rovira e Francesc Miralles

quinta-feira, 6 de outubro de 2016




"Existe um grande mundo lá fora, parte dele arguto e parte dele assustadoramente cruel: recentemente vi um filme sobre as mulheres no Irão que me fez ir beijar as minhas filhas adormecidas depois de o ver, e depois beijar o chão onde tivemos a sorte de nascer. Mas não faz sentido tornarmo-nos presunçosos. A Inglaterra libertou os seus escravos um século antes de nós, e neste momento muitos países do mundo consideram que a política dos EUA está desastradamente atrás no tempo em muitas questões, desde a conservação global à educação científica e à pena capital. Considero útil recordar isto quando, por vezes, dou por mim fora da opinião prevalecente aqui: o meu coração encontrou o seu caminho de modo independente para uma posição que está, num sentido mais lato, na moda. 
Mas quer esteja sozinha ou com muita gente, ainda estou obrigada pelo meu coração a permanecer onde nós votamos «nenhuma das opções acima» quando nos são apresentadas as igualmente odiosas opções de matar ou ser morto. Sinto-me insultada pela sugestão de que não existe mais nenhuma opção, quando as nações à nossa volta adoptaram estratégias muito diferentes, muitas delas menos beligerantes do que as nossas, com admirável sucesso. Sinto-me também insultada pela superficialidade do debate público, principalmente em tempo de guerra, fundamentado, como parece ser, em relatos noticiosos desprovidos de qualquer contexto histórico. Toda a nossa campanha contra os talibãs, a opressão das mulheres afegãs e Osama bin Laden foi conduzida sem que fizesse suficiente referência pública ao envolvimento anterior do nosso Governo com este desprezível triunvirato, a serviço de um rentável futuro gasoduto dos campos de gás do Turquemenistão. Se a CIA e alguns líderes corporativos dos EUA estiverem a romancear a mesma coisa noutro lugar, neste momento, por razões semelhantes, então esta conversa elevada de «Liberdade Duradoura» está a esgotar a minha paciência. Os homens encarregues das nossas guerras estão bem conscientes destas complexas histórias, mas falam connosco em termos de ameaças simplistas sem tonalidades de causa ou consequência, exactamente como se fôssemos todos crianças.
Espera-se que nós alinhemos neste plano, em que as pessoas perdem guerras e as empresas vencem-nas - os construtores de mísseis, as empresas mineiras, os magnatas do petróleo, e isso é só o que está à vista -, e uma pessoa pequena como eu não devia atrever-se a ser tão insolente ao ponto de sugerir um momento de pausa para rever o monstruoso desperdício humano de um ciclo interminável de retaliação violenta. Bom, eu estou a atrever-me. Li que alguns dos mísseis que estamos a usar contra o nosso inimigo actual - um dos países mais pobres do mundo - custam um milhão de dólares cada um. Perdoem a ultrajante sugestão, mas alguém já considerou mandar o dinheiro aos civis inocentes para que eles possam acabar com a desprezível tirania no seu seio e salvar toda a gente de uma enorme limpeza? Os grupos de pessoas tendem a juntar-se a cultos de raiva e vingança apenas quando estão desesperados. A História mostra que as populações com comida na barriga, capacidades de alfabetismo (incluindo nas mulheres), acesso à informação e imunidade contra as doenças mais importantes não toleram por muito tempo o martírio dos congéneres dos senhores da guerra talibãs ou de Saddam Hussein. E se esses cidadãos não nos estivessem totalmente gratos pela nossa ajuda na sua libertação, na pior das hipóteses eles poderiam apenas esquecer-se de nós - ao passo que a nossa actual estratégia de afirmar a predominância com bombas está a libertar alguns mas a matar de fome outros, fazendo com que milhões procurem refúgio em montanhas rochosas cobertas de neve, e, em última instância, a semear dentes de dragão de inesquecível inimizade sobre o solo de mais um deserto." - Barbara Kingsolver

quarta-feira, 5 de outubro de 2016




"Para ser feliz não basta esperar passivamente: há que agir. Porque a felicidade não é o destino de qualquer viagem, mas sim a atitude com que se viaja pela vida. A felicidade é uma maneira de viver. Uma maneira de viver que se pode aprender. 

Talvez não esteja nas nossas mãos que não haja tempestades. Mas está o navegarmos pela nossa vida da melhor maneira possível, no meio das tempestades." - Clemente García Novella 

segunda-feira, 3 de outubro de 2016




"«A árvore solitária cresce mais forte e isso permite-lhe dar frutos mais saborosos do que os das outras árvores. Mas, se te amares a ti próprio, não deves fazê-lo de forma a pores-te num pedestal do cimo do qual olhas o mundo. Tal como a árvore solitária, tens de te valorizar, para depois poderes partilhar esse valor com os outros. Só temos aquilo que podemos dar.»
Não importa o que és e sim o que podes vir a ser." - Álex Rovira e Francesc Miralles

domingo, 2 de outubro de 2016




"Eu sou apenas uma gota neste rio de lágrimas e crença. Por vezes o meu coração fica preso na garganta e eu tenho de parar por um segundo com a mão na maçaneta de uma porta ou no metal frio de uma chave, reunir no meu coração a misericórdia de tudo aquilo em que temos de acreditar, e dizer a minha própria oração por todos nós - que encontremos o caminho através de cada hora das nossas vidas que tenham sido dignas da missão. 
Consequentemente, considero mais difícil suportar adversários no outro extremo do espectro: aqueles que não podiam estar-se mais nas tintas, que não querem ou não conseguem sondar as profundidades honestas do amor e do sofrimento, que preferem não se envolver na montada de um touro pela vida em favor do beliche. Estes são aqueles que dizem que é ridículo imaginar que o mundo pudesse transformar-se numa coisa melhor do que esta. A abordagem mais sofisticada, sugerem eles, é aceitar que estamos todos numa alegre viagem pelas entranhas da catástrofe, por isso calem-se e conduzam. 
Eu combato isso; combato-o como se estivesse a afogar-me. Quando caio nesta sensação de que sou um exército de uma pessoa a destacar-me na vasta planície agitando a minha pequena bandeira de esperança, chamo um amigo ou dois e ofereço-me para fazer o jantar para nós. Lembramo-nos a nós mesmos que não estamos afastados da multidão, nós somos uma multidão. Somos uma fogueira na pradaria, um coro de igreja, uma nora maior no acorde americano, e a nora dominante na canção do mundo: um milhão de estudantes norte-americanos a rejeitar a tirania do logótipo e da loja de camisolas por trás dele; um milhar de agricultores na Índia deitados no seu solo para impedir que seja plantado com uma colheita que roubaria a sua história e o seu futuro; uma centena de pastores no sul de França a desafiar uma hegemonia de fast food ao produzirem queijo em grutas de calcário exactamente como faziam os seus bisavôs; anciães tribais de leste a oeste a convidarem a paz a entrar no mundo através dos seus dançarinos das nuvens hopi e dos seus dançarinos sufi; as Mulheres de Negro que se mantêm em silêncio eloquente em todos os continentes, recusando as guerras que comeriam vivos os seus filhos e filhas. Nós somos o teatro de rua, a alegria sincera dos corações das crianças, a literatura da sabedoria de amanhã chegada hoje, mesmo a tempo. Eu estou com a Emma Goldman: A nossa revolução vai ter dança - e comida excelente. Consequentemente, a escolha da vida em detrimento da morte é boa de mais para resistir. 
Quando tudo o resto falha e eu me esqueço disto, naquelas noites tardias em que todas as luzes já se apagaram na minha alma, entro no meu escritório e leio o outro correio, as pilhas de notas de amor que ultrapassam as  cartas de ódio na proporção de duzentas para uma. (Porque é que o louvor entra por um ouvido e sai por outro, para tantos de nós, enquanto memorizamos as críticas palavra por palavra? Pelas mesma razão que a rádio toca duzentas canções sobre solidão por cada uma sobre reuniões de família. Nós tiramos o chapéu ao desgosto.) Sou sustentada pela bondade de estranhos, que me mandam frequentemente presentes sem mais nem menos: uma aguarela de uma estante querida, um livro extraordinário sobre bichos-da-seda da América do Norte, um conto precioso de maravilha ou bondade, ou apenas a perfeição da gratidão, expressa de forma simples. Não posso de maneira nenhuma sentir-me sozinha quando tanta gente - desde prisioneiros a presidentes, mas principalmente gente comum - aceitou as minhas palavras nas suas vidas da mesma forma que aceitariam a companhia de uma amigo, que me diz calmamente no parque ou na mercearia, quando menos espero: «Obrigado. Continue a escrever.» E assim farei, e quando preciso da minha corda salva-vidas de palavras, leio Walt Whitman, George Eliot, John Steinbeck, Arundhati Roy - pessoas que aprenderam a olhar a vida nos olhos e a amá-la de volta.
Eu combato o afogamento, sabendo que nunca posso entrar no pântano do cinismo porque, se o fizer, posso nunca mais sair de lá. Eu não sou assim. Tenho filhas que são mais valiosas para mim do que a minha vida, e cada molécula em mim quer prometer-lhes que iremos ultrapassar isto. Não vamos explodir com o mundo antes de elas terem a oportunidade de fazerem todas as coisas que os adultos fazem nesta festa tão animada: estarem de pé em cima dos dois pés, partirem o coração, ultrapassarem isso, votarem, guiarem um carro, não guiarem um carro, ficarem exaustas a fazer uma coisa de que se orgulham, ouvir a estação de rádio que vocês querem, abrirem as portas do coração, dançarem na mesa, fazerem uma cena, serem ridículas, serem extraordinárias, serem mais fortes do que pensavam, fazerem um sacrifício que tem importância, descobrirem do que são feitas, cozinharem uma refeição perfeita, lerem um livro perfeito, beijarem durante uma hora, apaixonarem-se para sempre, fazerem amor, fazerem um bebé, permanecerem perante a vossa própria criança nua a chorar de medo e de espanto pelo milagre.
Se eu tivesse de fazer apenas uma lei, seria a de que os homens que tomam as decisões de lançar bombas tivessem primeiro, de todas as vezes, de passar um dia inteiro a tomar conta de um bebé. Nós não fomos feitos para fazer esta coisa de matar pessoas, eu juro. Recuem. É um grande erro." - Barbara Kingsolver 

sábado, 1 de outubro de 2016




"Uma coisa é esforçarmo-nos por deixar de ver o lado negativo das coisas e não ficarmos obcecados, sempre a pensar se a decisão tomada foi ou não realmente a melhor. E outra coisa muito diferente é desejar o impossível. Este último erro de percepção também é causa de infelicidade.
Nos nossos primeiros anos de vida, e sobretudo durante a nossa juventude, todos gritámos aos quatro ventos as nossas exigências de uma felicidade absoluta, permanente e completa. Mas, pouco a pouco, a vida vai-nos ensinando que, na verdade, nada é nosso, tudo pertence ao destino. Paulatinamente vamos aceitando como quimérica essa concepção juvenil da felicidade e vamo-nos conformando com pequenos momentos tranquilos e agradáveis. Costuma ser assim a transição para a velhice. O célebre aforismo de Aristóteles, «o prudente não aspira ao prazer, mas sim à ausência de dor», parece adaptar-se claramente melhor a alguém cujas forças declinam do que a uma pessoa repleta de vigor.
Expectativas impossíveis. Esperanças vãs às quais é melhor renunciar se não queremos que acabem por prejudicar a nossa felicidade... De que estou a falar? Estou a falar de que é melhor aceitar que nesta vida há coisas que são irrealizáveis. De que, como irrealizáveis que são, é melhor deixarmos de nos preocupar em consegui-las. E, sobretudo, que é melhor deixarmos de espernear e de nos enraivecermos por as coisas serem como são. 
Expectativas impossíveis. Querem exemplos concretos. Parece-me justo.
Primeiro exemplo: desejar que tudo esteja sob o nosso controlo absoluto, que nada escape à nossa vista. Outro, também bastante habitual: ser completamente irrepreensível quanto ao nosso próprio código ético. E consigo lembrar-me de um terceiro: ser uma cópia perfeita do nosso ideal de perfeição.
Na prática, todas estas coisas - e mais algumas outras - são inviáveis. Deixemos que os outros sejam os divinos, os arrebatadoramente perfeitos, aqueles cujo comportamento é irrepreensível. Devemos contentar-nos em ser humanos: de certeza que seremos muito mais felizes. Muitas das maiores tensões que temos de suportar nas nossas vidas resultam de querermos cumprir objectivos inalcançáveis que, curiosamente, fomos nós que estabelecemos. Faríamos um grande favor a nós próprios se, para variar, baixássemos um pouco a fasquia de vez em quando.
Não estou a pedir que renunciem aos vossos sonhos. Nem pensar. Isso nunca. Sempre gostei de acreditar que - dando-vos a minha versão de fragmento da obra de Shakespeare,  A Tempestade - a realidade é feita do mesmo material que os sonhos. Muitas das grandes coisas, materiais e não materiais (estou a pensar sobretudo no reconhecimento dos nossos direitos básicos como seres humanos), de que alguns quantos privilegiados do primeiro mundo podem desfrutar hoje em dia, conseguiram-se graças a muitas pessoas idealistas que tiveram sonhos. E graças ao facto de estas pessoas terem lutado para os tornarem realidade.
Aquilo que defendo, como forma de sermos mais felizes, é que não abdiquemos dos nossos sonhos, mas das expectativas utópicas.
Lembro-me de um quarto exemplo de expectativas impossíveis para acrescentar à lista: a expectativa de não querer ter problemas. Sinto muito por ser um desmancha-prazeres mas, pela minha experiência pessoal, querer passar pela vida sem problemas - maiores ou mais pequenos, mais frequentes ou menos - é de todo impossível. Penso que é melhor para a nossa felicidade aceitarmos esta realidade e, em seu lugar, esmerarmo-nos por alcançar um objectivo realizável, ou seja: ter o menor número possível de problemas. É impossível não termos contratempos, por isso é melhor aceitá-lo. Ter problemas é normal. O cinzento e o preto poderão parecer-nos feios, mas também são cores da vida. Com o mesmo direito que o cor-de-rosa.
«Cada pessoa é um mundo», diz, muito acertadamente, a sabedoria popular. Cada um de nós tem as suas próprias incoerências, paradoxos, conversas inconscientes entre o nosso lado racional e o emocional. E, muitas vezes, a única coisa que chegamos a conhecer de todo este frenesim cerebral que se está a produzir nas cabeças dos outros é o resultado visível: uma pessoa com ar feliz ou não. Os olhares dizem bem alto aquilo que o coração cala." - Clemente García Novella