segunda-feira, 31 de julho de 2017





"O carma não é fatalista nem predeterminado. O carma significa a nossa capacidade de criar e mudar. Ele é criativo porque podemos determinar como e porque é que agimos. Nós podemos mudar. O futuro está nas nossas mãos, bem como nas mãos do nosso coração. Buda disse:

O carma cria tudo, como um artista,

O carma compõe, como uma bailarina.

Uma vez que tudo é impermanente, variável e interdependente, a forma como agimos e pensamos altera inevitavelmente o futuro. Não há nenhuma situação, por mais irremediável ou terrível que pareça, como por exemplo uma doença terminal, que não possamos usar para evoluir. E não há crime nem crueldade que um arrependimento sincero e uma prática espiritual verdadeira não consigam purificar.

Portanto há sempre esperança. Até os assassinos e os criminosos mais inveterados podem mudar e ultrapassar as condicionantes que os levaram a cometer os seus crimes. A nossa situação presente, se a usarmos com habilidade e sabedoria, pode servir de inspiração para nos libertarmos a nós próprios da opressão do sofrimento.

Para os tibetanos, o carma tem um significado verdadeiramente vívido e prático na sua vida quotidiana. Eles vivem de acordo com o princípio do carma, com base no conhecimento desta verdade, e este é o fundamento da ética budista. Eles compreendem que se trata de um processo natural e justo. Por conseguinte, o carma inspira neles um sentido de responsabilidade pessoal no que quer que façam.

Será que é assim tão difícil de ver o carma em acção? Não basta olhar para trás na nossa própria vida para nos apercebermos claramente das consequências de algumas das nossas acções? Quando incomodámos ou magoámos alguém, isso não se repercutiu em nós? Não ficámos com uma recordação amarga e sombria e com vestígios de autorrepugnância? Essa recordação e esses vestígios são o carma. Os nossos hábitos e os nossos receios também se devem ao carma, ao resultado de acções, palavras ou pensamentos que protagonizámos no passado. Se analisarmos bem as nossas acções e nos tornarmos verdadeiramente conscientes delas, reparamos que há um padrão que se repete por si próprio nas nossas acções. Sempre que agimos negativamente, isso conduz-nos à dor e ao sofrimento; sempre que agimos positivamente, isso acaba por resultar em felicidade." - Sogyal Rinpoche

domingo, 30 de julho de 2017





"Há qualquer coisa de batoteiro em todos os seres humanos, a começar porque brincamos às escondidas connosco próprios e não nos queremos ver e aceitar-nos como somos. Queremos obter lucros de tudo, por vezes de forma muito mesquinha, sem perceber que, por vezes, perder é a maior vitória. Seja como for, como diz um adágio antigo: «Não vale a pena ter memória se mentimos.»" - Ramiro Calle

sábado, 29 de julho de 2017





"A sua mente descontente acompanhá-lo-á para onde quer que vá.

Estamos descontentes connosco próprios. Estamos descontentes com os outros, estamos descontentes com o lado exterior do mundo. Este descontentamento é como um oceano.

O nosso problema é não nos aceitarmos a nós próprios tal como somos e não aceitarmos os outros tal como são. Queremos que as coisas sejam diferentes de como realmente são, porque não entendemos a realidade. A nossa forma superficial de ver as coisas, as nossas ideias fixas e as nossas concepções erradas impedem-nos de ver a realidade daquilo que somos e de como existimos.

Temos de aprender a reconhecer que somos nós próprios que criamos todos os problemas humanos. Não devíamos culpar a sociedade por isso; não devíamos culpar os nossos pais ou o nosso companheiro ou o nosso patrão ou os nossos amigos; não devíamos culpar ninguém. Tal como somos os criadores de todos os nossos problemas, também somos os criadores da nossa própria libertação, da nossa própria alegria e de tudo o que é necessário para alcançar a ditosa libertação que o corpo e a mente que possuímos neste preciso momento contém." - Lama Thubten Yeshe

sexta-feira, 28 de julho de 2017






"Nas profundidades do Inverno, finalmente aprendi que dentro de mim existia um Verão invencível."

Albert Camus

Quanto mais avanço na idade, mais me apercebo de que o caminho espiritual - a vida encarada fundamentalmente através da perspectiva dos nossos valores e significados - implica paradoxos, confusões, becos sem saída e locais sombrios que, por vezes, constituem obstáculos com que nos temos de deparar. Qualquer caminho que procure evitar essas situações só nos poderá criar problemas.

Por muito tentador que possa parecer, uma vida vivida como se tudo fosse felicidade e beleza - ou pudesse ser, se soubéssemos a forma de o conseguir - é uma vida condenada quer a muita frustração desnecessária quer a uma abordagem sumária, superficial e ineficaz da sua essência.

O Verão contém sempre as sementes do Inverno. Quando se sentir em baixo, pense que tempos melhores virão. Por trás da alegria do sucesso escondem-se as raízes do fracasso. Mesmo nos momentos da mais soturna tristeza brilha a luz da nova energia e vida. Existem sempre duas faces: a escuridão e a luz, a alegria e a tristeza, o prazer e a dor, a morte e a vida, a morte e a ressurreição.

Não me classifique como uma daquelas pessoas que não gostam de realçar os aspectos bons e felizes da vida. 

O objectivo não é aceitar a vida tal como ela é? E, para tal, precisamos de momentos calmos, momentos em que nada nos possa distrair, momentos em que estejamos simplesmente presentes. Em caso contrário, poderemos ceder à tentação de evitar ou negar tudo o que não nos pareça fácil ou alegre." - David Kundtz

quinta-feira, 27 de julho de 2017





"Podemos afirmar que o segredo para deixar de ser um picuinhas é dar menos importância à comodidade. Até mesmo fugir dela.

Vivemos na era mais cómoda da História da Humanidade. Com efeito, o progresso ocidental tem no conforto o seu maior êxito: ar condicionado, aquecimento, máquinas de lavar, frigoríficos, sofás ergonómicos... E, contudo, cada vez nos encontramos mais perturbados no plano emocional.

Os meios de comunicação fizeram-nos crer que o conforto é a origem da felicidade, mas isso nunca foi verdade. O que não nos impediu de engolir a ideia. Aliás, para nos venderem produtos, as imagens dos anúncios limitam-se a apresentar pessoas basicamente felizes graças à comodidade, ao falso elixir do bem-estar.

Não obstante, a única certeza que temos é que a comodidade é como o chocolate: só é boa em certa medida. Um pouco de comodidade cai bem; demasiada comodidade provoca diarreias mentais. Porque uma pessoa feliz está activa, goza da natureza, interessa-se pelo que a rodeia, tem projectos mas não presta demasiada atenção ao conforto. Simplesmente não o faz!

Será que, se pudéssemos viver num ambiente inteiramente confortável - fechados para sempre numa divisão à temperatura perfeita, comida sempre à mão, sentados numa poltrona cómoda... para o resto da nossa vida -, seríamos felizes? Nem pensar! Que tédio!

No verão faz um calor que nos deixa a suar em bica? Que importa isso quando se está a viver uma inacreditável aventura em Banguecoque? Doem-lhe os pés e sente-se cansado? Que importa se estiver numa excursão montanhista e prestes a banhar os pés num regato?

O picuinhas tem de aprender que a felicidade e a comodidade são, muito frequentemente, incompatíveis. A sua hipersensibilidade ao ruído, às esperas nos engarrafamentos, aos erros dos demais... é devida, portanto, ao endeusamento que faz do conforto. Nesse sentido, é conveniente que nos perguntemos a nós próprios: «Prefiro ser feliz ou sentir-me sempre cómodo?» Importa compreender que não é possível ter as duas coisas ao mesmo tempo." - Rafael Santandreu

quarta-feira, 26 de julho de 2017





"O tipo de nascimento que teremos na próxima vida será determinado pela natureza das nossas acções nesta vida. E é importante nunca esquecer que o efeito das nossas acções depende inteiramente da intenção ou motivação que está por detrás delas e não da sua dimensão. 

Shantideva afirmou:

Toda a alegria que há neste mundo 

Vem de desejar felicidade aos outros,

E todo o sofrimento que há neste mundo

Vem de desejar que eu próprio seja feliz.

Devido à inevitabilidade e à infalibilidade da lei do carma, sempre que prejudicamos os outros estamos directamente a fazer mal a nós mesmos e sempre que lhes proporcionamos felicidade estamos a cultivar a nossa felicidade futura. Como tal, o Dalai Lama afirma:

Se tentar vencer os seus impulsos egoístas - a ira e por aí adiante - e desenvolver mais bondade e compaixão pelos outros, no final acaba por se beneficiar mais a si próprio do que aconteceria se assim não fizesse. Por isso, às vezes digo que a pessoa egoísta sensata deve praticar deste modo. As pessoas egoístas e insensatas pensam sempre nelas próprias, e o resultado é negativo. As pessoas egoístas e sensatas pensam nos outros, ajudam os outros tanto quanto podem, e o resultado é que elas próprias também beneficiam. 

A crença na reencarnação mostra-nos que há um certo tipo de justiça ou bondade suprema no universo. É essa bondade que todos tentamos desvendar e libertar. Sempre que agimos de um modo positivo, avançamos na sua direcção, sempre que agimos de um modo negativo, obscurecemo-la e inibimo-la. E quando não conseguimos expressá-la na nossa vida e nas nossas acções, sentimo-nos infelizes e frustrados. 

Assim sendo, se tivesse de extrair uma mensagem essencial do facto da reencarnação, seria: desenvolva este bom coração que deseja que outros seres encontrem a felicidade duradoura e que age para assegurar essa felicidade. Fomente e pratique a bondade. O Dalai Lama afirmou: «Não há necessidade de templos; nem necessidade de filosofias complicadas. O nosso próprio cérebro, o nosso próprio coração é o nosso templo; a minha filosofia é a bondade.»" - Sogyal Rinpoche

terça-feira, 25 de julho de 2017





"A sabedoria também comporta sabedoria quotidiana, não é apenas um cúmulo de conhecimentos emprestados, sem qualquer aptidão para poder resolver as dificuldades de cada momento." - Ramiro Calle

segunda-feira, 24 de julho de 2017





"A mente humana não se satisfaz somente através do mundo sensorial.

O apego emocional surge ao experienciarmos sensações agradáveis, e é quando estas desvanecem que aparece o desejo: o desejo de voltar a senti-las. A aversão surge quando sentimos algo desagradável: automaticamente percebemos que não gostamos e queremos livrar-nos das sensações desagradáveis que, uma vez mais, perturbam a nossa paz de espírito. E a ignorância surge quando nos sentimos indiferentes ou aborrecidos: ignoramos o que se passa à nossa volta e não queremos ver a realidade.

Este tipo de mente caracterizada pelo apego, pela aversão e pela ignorância tem como natureza o descontentamento.

Quando era criança, talvez adorasse e desejasse comer gelado, chocolate e bolo e pensasse: «Quando for grande, vou comer todos os gelados, chocolates e bolos que me apetecer e, aí sim, serei feliz!» Agora pode comer todos os gelados, chocolates e bolos que quiser, mas continua a não se sentir satisfeito. Por isso, e já que nada disso o deixa feliz, decide comprar um carro, uma casa, uma televisão, decide arranjar um marido ou uma mulher, ter filhos e um emprego, e só então se sentirá feliz. Agora já tem tudo o que desejava, mas o seu carro é um problema, a sua casa é um problema, o seu marido ou a sua mulher é um problema, os seus filhos são um problema. Então apercebe-se: «Ah! A satisfação não é isto»

Portanto, vai à procura de uma cura para esse descontentamento.

Contudo, apesar de a medicina moderna ser claramente capaz de atenuar os males físicos, jamais conseguirá curar as mentes descontentes e indisciplinadas. Nenhum tipo de medicina é capaz de gerar um sentimento de satisfação. E mais: não conseguirá fugir aos seus problemas, nem que vá para a Lua." - Lama Thubten Yeshe

domingo, 23 de julho de 2017





"Ansiamos por um momento de paz e calma, para de imediato ligar o rádio, fazer um telefonema ou levar a cabo uma missão qualquer assim que a oportunidade de solidão se apresenta."

Ronnie Polanezcky

Imagine-se nos seus momentos de transição, especialmente naqueles que são súbitos, rápidos ou implicam mudanças radicais: quando passa do ritmo frenético de trabalho para a calma do seu lar (ou então, exactamente o contrário), quando abandona um dia de trabalho solitário para se reunir com um grande grupo de pessoas que conversam animadamente; quando transita do ruído de uma aula de 5º ano para o silêncio do caminho até casa; quando se desloca de uma cidade agitada para uma aldeia no campo; quando tem de enfrentar uma nova vida a sós depois de uma longa vida a dois.

Cada transição traz consigo uma sensação de estranheza e um momento de desorientação. Frequentemente, a primeira tendência é preencher essa lacuna com algum tipo de agitação, mesmo se, tal como a citação nos indica, declaramos ansiar por paz e sossego.

Recordo facilmente as inúmeras ocasiões em que preenchi esses momentos de desconforto, esses espaços "de/para", com uma actividade que me distraiu daquilo que realmente se estava a passar. Invariavelmente, acabo sempre por lamentá-lo.

Hoje, incito-o simplesmente a participar calmamente em qualquer período de transição por que esteja a passar. Deixe-se ficar nele por alguns momentos. Observe o que se passa consigo, reconheça a desorientação e traga toda a sua atenção para o presente. Por exemplo, ao chegar a casa depois do trabalho, em vez de se precipitar para a porta, ligar o rádio, e levantar o auscultador do telefone, deixe-se ficar sentado no carro (ou nas escadas à porta de casa) durante dois minutos. O mundo não se vai desmoronar se perder dois minutos. 

No entanto, é preferível que saiba aquilo de que precisa e como pretende lidar com este tempo totalmente novo na sua vida, porque assim estará um pouco mais preparado para enfrentar esta nova forma de ser." - David Kundtz

sábado, 22 de julho de 2017





"O segredo para se ter uma mente excepcional, para viver com uma paixão eléctrica do primeiro ao último minuto, é a inteligência emocional, isto é, saber utilizar a gasolina que faz mexer as paixões da vida: desfrutar de tudo o que fazemos, aprender, amar, brincar, produzir arte e, sobretudo, não perder tempo com queixumes.

Ser inteligente no plano emocional é ter a clara noção - o mais clara possível - de quais são as qualidades que realmente tornam a vida emocionante e quais são os falsos atributos, ou as «qualidades falsas», como as costumo designar. E não perder tempo com as últimas.

Que qualidades falsas são essas que, como a gasolina adulterada, acabam por avariar o motor da nossa vida? Nelas se incluem a beleza física, a inteligência, a elegância, a eloquência... São qualidades falsas porque, se numa primeira instância alimentam o ego, a isso se segue um vazio. São atributos que permitem acumular coisas que mais tarde terão de ser amontoadas em arrecadações inúteis. Que suscitam a admiração dos imprudentes e dos imaturos. Mas que não nos trazem felicidade.

Digamo-lo alto e bom som: a beleza física, as habilidades, a riqueza, a inteligência... são atributos que não servem para quase nada!

E, por outro lado, quais são as virtudes que realmente nos permitem crescer, tornarmo-nos mais fortes e desfrutar cada vez mais da vida? A arte, o amor, a amizade, a tolerância à frustração, a própria inteligência emocional, a perseverança... estas qualidades atraem pessoas fortes e saudáveis, que partilham, acrescentam e tornam a nossa vida verdadeiramente melhor." - Rafael Santandreu

sexta-feira, 21 de julho de 2017





"A verdade e a força impulsionadora por detrás do renascimento é o que se chama carma. No Ocidente, o carma é muitas vezes totalmente mal interpretado como destino ou fatalidade; a melhor forma de o encarar é como a lei infalível de causa e efeito que rege o universo. A palavra carma significa literalmente «acção», e é tanto o poder latente no seio das acções como também os resultados que as nossas acções acarretam.

Em termos simples, o que significa carma? Significa que o que quer que façamos, com o nosso corpo, fala ou mente, terá um resultado correspondente. Cada acção, até mesmo a menor possível, está impregnada com as suas consequências. Os mestres costumam dizer que até uma pitada de veneno pode causar a morte e mesmo uma semente minúscula pode tornar-se numa árvore enorme. E tal como Buda afirmou: «Não subestime as acções negativas simplesmente porque são pequenas; por mínima que seja, uma faísca pode incendiar um monte de feno tão grande como uma montanha.» Do mesmo modo, ele disse: «Não subestime as acções positivas de menor dimensão, julgando que não têm qualquer benefício; até mesmo gotas de água minúsculas acabam no final por encher um grande recipiente.» O carma não se deteriora como as coisas exteriores, nem nunca se torna ineficaz. Não pode ser destruído «pelo tempo, fogo ou água». O seu poder nunca desaparecerá, até ter amadurecido.

E, no entanto, o que mais para além do carma poderia verdadeiramente começar a explicar de um modo satisfatório as diferenças colossais e extraordinárias entre nós? Apesar de podermos ter nascido no seio da mesma família ou no mesmo país, ou em circunstâncias semelhantes, todos temos personalidades distintas, acontecem-nos coisas completamente diferentes e temos diversos talentos, inclinações e destinos." - Sogyal Rinpoche

quinta-feira, 20 de julho de 2017





"No seu sentido mais profundo, o termo «indiferente» quer dizer não fazer diferenças. É preciso exercitarmo-nos para ser indiferentes tanto para o elogio como para o insulto, não nos deixando deslumbrar pelo elogio e não permitindo que o insulto nos abata ou gere rancor." - Ramiro Calle

quarta-feira, 19 de julho de 2017





"Permita-me acreditar que decidiu caminhar em direcção a uma maior realização pessoal. Permita-me então pensar que se ocupou em conhecer-se todos os dias um pouco melhor, que conquistou o espaço da sua autonomia e, depois de se entregar a amar o melhor que seria capaz, que conseguiu rir-se dos seus defeitos. Como se permitiu escutar de uma forma activa, aprendeu com humildade e começou a ser mais cordial e a organizar o seu tempo tendo em consideração o tempo dos outros. Agora que sabe oferecer de uma maneira mais atraente o que é e o que faz, poderá escolher mais correctamente aqueles que o rodeiam. 

Permita-me acreditar que conseguiu confirmar algumas coisas que já sabia e rectificar outras que também conhecia, conseguiu actualizar os seus conhecimentos, colocar a sua criatividade ao serviço daquilo que lhe é mais precioso, que é você, e aperceber-se de que a melhor forma de atingir a igualdade é aproveitar todos os dias da sua vida. Por essa razão, agora age de modo a pôr fim aos vícios que o condicionam e ao seu apego às coisas e às pessoas, corre riscos que antes avaliou e negoceia apenas quando é necessário fazê-lo, sem ceder aquilo de que não deseja abrir mão e tirando partido dos seus fracassos.

Por fim, não tema ter de recomeçar, como diz Alejandro Lerner na sua canção, ou como sugere Hamlet Lima Quintana no seu poema Sin fin [Sem Fim]:

[...] Que cada um cumpra o seu próprio destino,

escolha o seu rumo, reconheça os seus poços, regue as suas 

plantas e, quando se aperceber de que errou o caminho, 

volte a percorrê-lo e reconstrua a sua casa.

Agora, depois de ter andado e voltado para trás, depois de ter assistido a algumas catástrofes e demolições, fruto de alguns erros cometidos durante o seu trajecto, depois de se ter decidido a reconstruir a casa, resta-lhe apenas dar mais um passo em conjunto, o último, o fundamental, talvez o mais decisivo.

Poderíamos propor-lhe muitos nomes, mas eu prefiro descrevê-lo como aprender a confiar no resultado final.

Não há dúvida de que aprender a confiar nas nossas capacidades, nos nossos dons e nas possibilidades com que nos deparamos é algo que nos permite alcançar qualquer tipo de objectivos com êxito. 

Menosprezar os outros não funciona e devemos, sobretudo, rodear-nos de mensagens de confiança, fortalecidos e motivados pela aposta renovada em nós próprios.

Talvez seja verdade que nem todos são capazes de alcançar um êxito específico desejado, mas é verdade que todos podemos atingir tudo aquilo que pretendemos se pusermos de lado a urgência, se perseverarmos, agindo em conformidade com o nosso desejo, sempre e quando este seja autêntico, e não uma necessidade dos outros «plantada» no nosso coração.

É habitual atribuir-se mais vezes as nossas frustrações à nossa impaciência do que à nossa falta de possibilidades concretas, e talvez seja uma realidade.

Quando perguntam ao Dalai Lama o que irá acontecer à parte do território tibetano que se encontra sob o poder chinês, o grande mestre responde: «Eles sabem que estão a agir incorrectamente. Mais tarde ou mais cedo aperceber-se-ão de que esse território não lhes pertence e devolvê-lo-ão ao seu povo. Sabemos que isso pode demorar mil anos, mas não temos pressa. Tranquiliza-nos o facto de sabermos que um dia acontecerá.»

Todavia, nós somos ocidentais e não conseguimos esperar que as coisas aconteçam século após século. Necessitamos de intervir, empurrar, torcer, arrumar. Temos de sentir que somos nós os executores da vontade do Cosmos, ou pelo menos acreditar que o fomos em parte. Não me parece mal. Tudo o que sucede no mundo, para o bem ou para o mal, contém uma percentagem de acção nossa. Uma participação que por vezes é fundamental, e outras insignificante, mas está sempre presente. Não é possível ignorarmos a influência que tivemos em todos os êxitos que rodeiam tudo o que desejamos e queremos e com os quais interagimos de forma directa ou indirecta. Aceitar todas as coisas que nos rodeiam significa aprender a somar ao aspecto pessoal o familiar, o social; ao sonho a atitude; ao desejo o projecto; à necessidade a acção; ao mérito o trabalho; à paciência a decisão de nunca perder o rumo; à perseverança a criatividade.

Nas circunstâncias mais difíceis e nos momentos em que somos invadidos pela sensação de termos perdido o rumo, a certeza do resultado final é justamente o que nos poderá levar a recuperar a força para agirmos e para arriscarmos, a motivação para prosseguirmos, para desejarmos, para insistirmos, para valorizarmos o caminho percorrido e para continuarmos a lutar por aquilo em que acreditamos." - Jorge Bucay

terça-feira, 18 de julho de 2017





"Uma das dádivas que nos trazem os momentos de calma é a disponibilidade de receber o que nos é oferecido. Mas essa disponibilidade vem de braço dado com a vulnerabilidade! As coisas são mesmo assim, quando você se mostra aberto, encontra-se simultaneamente numa posição vulnerável. Não perderá as maravilhas que são postas à sua disposição, mas poderá igualmente acabar magoado ou esmagado. É um risco!

Eis uma experiência recente de um amigo meu: tinha acabado de se sentar no lugar que lhe fora destinado, junto ao corredor, na parte posterior de um avião apinhado de gente, e estava a arrumar as suas coisas, quando outro passageiro o abordou, dizendo-lhe:

- Você está no meu lugar, tem de sair daí!

Ele verificou o bilhete e constatou que se encontrava, de facto, na cadeira certa.

O homem pelo seu lado,  apresentou um bilhete exactamente com o mesmo número de lugar enquanto exclamava a alto e bom som:

- Bom, você tem de mudar para outro sítio qualquer! Este é sempre o meu lugar, e por isso vou-me sentar aqui e é já!

Todos os olhos e ouvidos estavam dirigidos para o que se estava a transformar numa pequena cena.

O meu amigo, nesse momento já de pé, considerou as suas opções. Quando a hospedeira se aproximou, disse-lhe:

- Se este homem se quer sentar aqui, tudo bem. Posso sentar-me noutro sítio qualquer!

Triunfante, o homem sentou-se imediatamente, enquanto a hospedeira - elevando ligeiramente a voz - disse-lhe:

- Muito obrigada. Há um lugar livre na primeira classe, por favor acompanhe-me.

O meu amigo seguiu o seu desejo de ser cooperante e pacífico, e correu o risco de ser visto como o perdedor durante a discussão." - David Kundtz

segunda-feira, 17 de julho de 2017





"Todos temos a capacidade de gozar a vida. Só temos de nos abrir, de explorar a vida com a devida paixão. Quando somos jovens parece que temos maior facilidade em nos entregarmos à diversão, em viver as emoções à flor da pele, mas a verdade é que o podemos fazer com qualquer idade, aproveitando a torrente de força contida no nosso cérebro." - Rafael Santandreu

domingo, 16 de julho de 2017





"Pode tornar o sítio onde medita num simples paraíso com uma flor, um pau de incenso, uma vela, uma fotografia de um mestre iluminado ou uma estátua de uma divindade ou de um buda. Podem transformar o quarto mais comum num espaço íntimo e sagrado, com um ambiente onde cada dia se encontra com a sua verdadeira natureza de um modo alegre, como uma ocasião feliz de encontrar um velho amigo.

E se a meditação não ocorrer facilmente no seu quarto urbano, seja criativo e vá passear na natureza, que é sempre uma fonte de inspiração infalível. Para acalmar a sua mente, dê uma volta pelo parque ao amanhecer ou observe o orvalho numa rosa de um jardim. Deite-se no chão e olhe para o céu, permitindo que a sua mente se expanda na vastidão desse espaço. Deixe que o céu exterior desperte um céu no interior da sua mente. Pare junto a um riacho e associe a sua mente ao seu murmúrio; torne-se uno com o seu som incessante. Sente-se junto a uma cascata e permita que as suas gargalhadas terapêuticas lhe purifiquem o espírito. Caminhe numa praia e sinta o vento marítimo pleno e doce a acariciar-lhe o rosto. Celebre e use a beleza do luar para apaziguar a mente. Sente-se ao pé de um lago ou num jardim e, respirando serenamente, deixe que a sua mente se silencie enquanto a Lua se ergue majestosamente numa noite sem nuvens. 

Tudo pode ser usado como um convite à meditação. Um sorriso, um rosto no metropolitano, a visão de uma pequena flor a desabrochar na fenda de um pavimento de cimento, a maneira como um tecido caro cai na montra de uma loja, o modo como a luz do Sol ilumina os vasos de flores no parapeito de uma janela. Esteja atento a todos os sinais de beleza ou graça. Ofereça cada alegria e tome consciência, em todos os momentos, das «novidades que chegam constantemente do silêncio». 

Lentamente acaba por se tornar um mestre do seu próprio bem-estar, um alquimista da sua própria alegria, com todo o tipo de elixires sempre à mão para elevar, animar, iluminar e inspirar cada respiração e movimento." - Sogyal Rinpoche

sábado, 15 de julho de 2017





"Um menino brincava com um barquinho numa fonte, completamente absorto na sua brincadeira. Um iogue que passava por lá aproximou-se dele e começou a falar-lhe e a fazer-lhe perguntas. O menino estava tão ensimesmado com a navegação do barco sobre as águas que nem sequer reparou na presença de um adulto. Então, o iogue ajoelhou-se em frente ao menino e disse:

- Tu és o meu mestre. Oxalá cada vez que me sente a meditar, a dirigir os pensamentos ao Absoluto, possa estar tão concentrado como tu e que, como te acontece a ti, nada possa distrair-me.

Reza um adágio hindu: «Assim como o fogo queima, a mente tende a distrair-se.» Uma força que dispersa perde a sua eficácia. A mente não é uma excepção. Como o agricultor encaminha as águas no canal, é preciso encaminhar a mente para a concentração, para que ganhe em intensidade, claridade, penetração e compreensão. O ioga é uma reunificação das energias dispersas e comporta união e harmonia. É preciso treinar as técnicas para unificar e harmonizar a mente. Uma mente bem controlada é de uma grande ajuda, enquanto uma mente dispersa nos debilita, sendo como um coador incapaz de reter seja o que for." - Ramiro Calle

sexta-feira, 14 de julho de 2017





"No percurso da nossa vida, chegamos inúmeras vezes a pontos mortos, becos sem saída, situações até às quais fomos conduzidos por um erro tão importante que cometemos que não é passível de ser corrigido. É nesses momentos que nos devemos recordar da decisão de recomeçar.

Há mil anos, Heráclito afirmou numa só frase que representa a inapelável verdade do óbvio: «Ninguém toma banho duas vezes no mesmo rio.»

Começar «de novo» e não outra vez, aproveitando do percurso anteriormente realizado aquilo que aprendemos, permite-nos descobrir os novos erros do novo caminho que traçámos. 

Este passo chama-se «Recomeçar», não no sentido de fazer o mesmo outra vez, mas na acepção de regressar ao início, de retroceder, de caminhar para trás até ao local onde nos enganámos durante o nosso trajecto ou ao local onde o caminho termina.

Regressar a um local onde já estivemos, sabendo de antemão que a situação já não será a mesma e que o meio envolvente também será diferente.

Regressar com a consciência de que, mesmo que tudo tenha mudado, eu serei o mesmo e, paradoxalmente, com a consciência de que, na realidade, nem eu serei exactamente aquilo que era." - Jorge Bucay

quinta-feira, 13 de julho de 2017





"Muitos homens procuram o prazer a uma velocidade tão desmedida que acabam por lhe passar ao lado."

Soren Kierkegaard

"Parece ser uma característica dos jovens levarem a vida numa tal correria que acabam por perder as melhores partes. Mas, na parte que me toca, também arrastei fervorosamente essa característica juvenil para a idade adulta. Ainda hoje tenho de fazer um esforço para não passar a correr ao lado daquilo que me dá prazer. (Tenho de repetir frequentemente este conselho para mim mesmo durante as refeições: a minha tendência é comer excessivamente depressa, sem saborear os alimentos e, consequentemente, sem qualquer prazer.)

Os executivos afiguram-se particularmente propensos a esta tendência, de acordo com a minha observação. Deve decorrer da própria natureza da concretização dos negócios, competitiva e rápida, e do facto de ser o vencedor - o mais bem sucedido nessa área - aquele que recebe o prémio do sucesso financeiro.

Muitos "trepadores" bem sucedidos na escala empresarial, mais tarde vêem-se a si próprios como aqueles que estavam tão concentrados, tão diligentes, tão esforçados, procurando subir os degraus numa correria tão desenfreada, que nem repararam num elemento fundamental para a sua procura: a escada estava encostada à parede errada!

Só quando atingem o topo é que se apercebem. Um exemplo: "Oops! Sou um executivo de topo, mas o que realmente gostava era de ser escritor!" Quando olham para trás, reconhecem o que deixaram de lado, nessa corrida: a professora do liceu que os encorajou a escrever, o prémio ganho na faculdade por um trabalho de composição, o desejo de escrever um romance - todos esquecidos e rapidamente postos de parte.

Os momentos em que não fazemos nada, de devaneio, de despertar para os nossos verdadeiros anseios e paixões, levam-nos a descobrir e a reconhecer aquilo que nos dá prazer.

Nunca é tarde para encontrar outra parede ou subir por uma escada diferente." - David Kundtz

quarta-feira, 12 de julho de 2017





"Vivemos num mundo redondo no qual encaixamos que nem uma luva, num universo em que tudo bate certo, em que tudo existe para que possamos fruir com naturalidade: as cores vivas da natureza, as formas das folhas das árvores, a companhia agradável das pessoas, o ar fresco da manhã...

Sim, as pessoas estão dotadas de imaginação e essa fantasia pode dar lugar a coisas que não existem, como vampiros ou dragões, mas que não são mais do que isso: criações mentais. A natureza não é assim. A vida real é uma pechincha!" - Rafael Santandreu 

terça-feira, 11 de julho de 2017





"A verdadeira glória da meditação não reside num determinado método, mas na experiência de vida contínua de estar presente, do bem-estar, claridade e paz e, sobretudo, da ausência total de apego. A diminuição do apego indica que está a libertar-se cada vez mais de si próprio. E quanto mais experimentar essa liberdade, mais se torna evidente que o ego e também as esperanças e os medos que o mantêm vivo estão a dissolver-se, aproximando-se cada vez mais da infinitamente generosa «sabedoria que compreende a ausência do ego». Quando morar na casa desta sabedoria, deixará de encontrar uma barreira entre «eu» e «tu», «isto» e «aquilo», em suma, terá finalmente chegado à sua verdadeira casa, o estado de «não-dualidade»." - Sogyal Rinpoche

segunda-feira, 10 de julho de 2017





"Devíamos modificar  os modelos sociais e o facto de ser quem recebe, quem tenha de agradecer. Devíamos sentir-nos privilegiados e agradecidos por ter a possibilidade de dar e, desse modo, beneficiar os outros e poder exercer o nosso sentimento de caridade e compaixão." - Ramiro Calle

domingo, 9 de julho de 2017





"O desenvolvimento pessoal é o facto mais importante da nossa vida, representa simultaneamente a meta e o desafio e é condição para a nossa própria realização, assim como uma paragem forçada para descobrirmos a nossa capacidade de ajudar os outros.

Mas este crescimento interior, tal como o concebo, apenas pode ser alcançado através da experiência quotidiana de vivermos e errarmos. A aprendizagem é aquilo que colhemos por recriarmos o que foi vivido, representando muito mais do que um simples exercício intelectual.

Na verdade, pedagogicamente falando, apenas se pode aprender a partir do erro. Se a primeira vez que realizarmos uma tarefa esta ficar bem-feita, poderemos alardear a nossa vaidade, mas não teremos aprendido nada, pois já a sabíamos executar. Se em jogo se encontra a nossa orgulhosa luta pelo êxito, as nossas alegrias assentam apenas em conseguirmos atingir a perfeição. Se o mais importante para nós é a aprendizagem e aliado a esta o crescimento, então errarmos constituirá uma parte relevante e desejável do processo.

Mesmo que nos enganemos, é importante termos feito o que fizemos. Pelo menos teremos aprendido alguma coisa. Talvez tenhamos aprendido que essa não era a maneira correcta de levarmos a cabo o que pretendíamos, ou que não era o momento certo, ou que não era a pessoa certa, ou, quem sabe, que fazer o que fizemos não era tão simples como parecia.

O medo que sentimos de nos enganarmos resulta da nossa educação. Desde crianças que nos dizem que devemos tentar não cometer erros. Este é um dos ensinamentos mais importante de todas as sociedades do planeta, a mais condicionadora de todas as regras da nossa cultura e o mais prejudicial de todos os mandamentos.

Hoje já me parece tarde, mas se me tivesse consultado quando tinha cinco anos de idade, teria sido fácil transformá-lo num indivíduo sobredotado. Bastaria ter estabelecido um sistema de prémios para o recompensar por cada erro que tivesse sido capaz de inventar e cometer.

Como só se aprende com os erros, em pouco tempo transformar-se-ia numa criança genial. A verdade é que eu não o teria feito e, por outro lado, os seus pais nunca teriam permitido que fosse seguido este sistema educativo.

A nossa cultura distancia-se muito desse caminho, ainda que afirme que persegue esse objectivo. Sobrecarregamos as crianças, exigindo-lhes cada vez mais que não cometam erros e, desta forma, logicamente, condicionamo-las a acreditar que necessitam sempre de alguém, com mais poder ou autoridade, que lhes aponte o que é adequado e inadequado relativamente àquilo em que acreditam. Precisamos de pais que nos ensinem o que está correcto, para nos protegerem de todo o mal; necessitamos de leis duras que nos digam o que devemos fazer, quem devemos ser e que castiguem com crueldade aqueles que não as cumprem; queremos governantes autoritários que nos forneçam ordens, argumentos e ameaças para que a sociedade não cometa mais erros e para que não tenhamos mais surpresas nem sobressaltos.  Agimos como se não quiséssemos crescer, como se desejássemos continuar a ser crianças, ambicionando que outra pessoa se ocupe de tudo; alguém que, a partir de cima, política, geográfica e espiritualmente falando, nos obrigue a todos a fazer «o que é correcto» e nos proteja da solidão, do abandono, da dor e do desprezo daqueles que não nos permitem cometer erros. Somos treinados de inúmeras maneiras para evitar o erro e apenas nos sentimos seguros quando o fazemos, esperando que os outros também o façam." - Jorge Bucay

sábado, 8 de julho de 2017





"Gordas... viciadas... arruinadas... uma casa cheia de trastes... e sem tempo para nada."

Mary Pipher

"Esta é a forma como as famílias acabam, se permitirem, pura e simplesmente, que a cultura dominante tome conta delas. A implicação é clara. Somos chamados a enfrentar a cultura de uma forma pro-activa, a pôr em prática uma vida intencional, a sermos activos e não apenas reactivos, e a desejar, tal como Thoreau, "viver deliberadamente". 

Quando nos encontramos em sossego, conseguimos ver melhor o que sabemos e o que valorizamos. Não aceitamos tudo o que as vozes irreflectidas do mundo nos dizem. Esse é o efeito de estar desperto e recordar quem somos. Somos capazes de viver com um objectivo, intencionalmente e não apenas por rotina.

Medite:

Somos completamente ingénuos se pensarmos "a publicidade não me afecta. Simplesmente não lhe dou ouvidos". 

Pensamos erradamente se concluirmos que "as afirmações falsas são inofensivas, toda a gente as faz". 

Frequentemente, somos ludibriados se aceitarmos e acreditarmos em tudo o que nos é dito, seja por que tipo de autoridade, sem qualquer lugar a crítica.

Seremos perigosamente decepcionados se permitirmos que alguém (algum grupo ou instituição) pense e tome decisões por nós." - David Kuntz

sexta-feira, 7 de julho de 2017






"A vida está cheia de possibilidades de fruição, desde que não nos apeguemos a nenhuma delas.

Não há nada mais belo do que apreciar o que existe lá fora: as flores, a luz, objectos em movimento como as folhas das árvores. Chegará o momento em que tudo isto deixará de existir. Neste universo tudo tem o seu fim e, dentro de cinquenta ou cem anos, talvez tenhamos destruído de tal forma o planeta que a cor, a luz ou as árvores não sejam as mesmas. Ou talvez, o tenhamos feito implodir.

Quando estamos lúcidos, apreciamos o milagre da vida lá fora e essa subtil apreciação basta para nos encher o coração: nem namorados, nem empregos perfeitos... basta a luz do sol ao amanhecer.

Por isso, ter uma mente saudável implica não ter apego a nada nem a ninguém. A felicidade advém de não criarmos necessidades e de gozarmos daquilo que cada momento tem para nos oferecer." - Rafael Santandreu

quinta-feira, 6 de julho de 2017





"Por vezes, as pessoas consideram que quando meditam não devem ter nenhum pensamento ou emoção; e quando surgem pensamentos ou emoções, ficam aborrecidas e exasperadas consigo próprias por julgarem que falharam. Nada pode estar mais longe da verdade. Há um ditado tibetano que diz: «É absurdo pedir carne sem ossos e chá sem folhas.» Enquanto tiver mente, haverá pensamentos e emoções.

Tal como o oceano tem ondas ou o Sol tem raios, também a radiância da própria mente consiste nos seus pensamentos e emoções. O oceano tem ondas, no entanto, ele não é particularmente perturbado por elas, uma vez que elas são a sua verdadeira natureza. As ondas elevam-se, mas para onde vão? De volta para o oceano. E de onde vêm as ondas? Do oceano. Da mesma forma, os pensamentos e as emoções são a radiância e a expressão da verdadeira natureza da mente. Eles emergem dela, mas onde se dissolvem? Na própria mente. O que quer que surja, não o encare como um problema específico. Se não reagir de modo impulsivo e se se limitar a ser paciente, isso acabará por assentar de novo na sua natureza essencial." - Sogyal Rinpoche

quarta-feira, 5 de julho de 2017





"O amor é o amor. É uma actividade emocional, uma atitude, uma fragrância, uma essência. O amor é o amor. Quando se ama, partilha-se, inclusive, o tempo, que por vezes regateamos tanto aos outros nesta era de pressa e ansiedade inúteis. O amor é compaixão, e a compaixão permite-nos identificarmo-nos com a dor alheia e tentar aliviá-la, assim como nos leva a desenvolver a alegria pelo sucesso e bem-estar dos outros. O amor transforma-se em antídoto do ódio, contra o rancor, a malevolência, a intolerância e a inveja. O amor é o amor. Pode dizer-se mais? Não é para ser dito, mas para ser sentido." - Ramiro Calle

terça-feira, 4 de julho de 2017





"Nas relações não comerciais existe pouco para negociar. Não acredito nos casais cujo relacionamento assenta na ideia de sacrificar aquilo de que cada um mais gosta apenas para agradar ao outro. Em troca, este deve aceitar abrir mão do que mais aprecia. Não acredito que as relações inter-humanas possam ser avaliadas por aquilo que somos capazes de ceder, mas sim por aquilo que somos capazes de partilhar.

Não consigo gostar do enunciado quase mercantilista mas universalmente aceite de «hoje por ti, amanhã por mim». Em primeiro lugar, porque preferiria que fosse possível ser hoje por ti e amanhã e depois também (porque não?). Em segundo lugar, porque aquilo que dou a alguém não é passível de ser negociado (a verdadeira ajuda assenta na gratuitidade daquilo que dou). Por fim, em terceiro lugar, porque se algum dos dois decide ceder generosa e desinteressadamente algo que possui, espero que a educação que recebeu o tenha ensinado a diferenciar essa atitude dos seus investimentos comerciais e que perceba que já está a receber uma recompensa pela sua acção. Ninguém deverá recompensar-me por aquilo que dou com o coração. A recompensa que recebo consiste em poder dar e em não haver nada para negociar, nem no Céu nem na Terra.

Isto adquire um certo dramatismo quando, no consultório dos terapeutas, nos quartos ou em salas, os casais discutem a possibilidade de negociar maneiras de ser e de agir. Estratégias para ceder de maneira artificial em troca de um gesto equivalente do outro, o que significa deixar de ser aquilo que sou, tendo como argumento forçar alguém a renunciar àquilo que é. Isso é horrível!

Nem sempre a realidade da vida é equitativa e em geral é mesmo bastante injusta. Mas esse facto não deveria desmoralizar-nos e muito menos ser usado para justificar outras injustiças mais «humanas». Pelo contrário, deveria tornar mais profundo o compromisso vital de cada pessoa com aquilo que a rodeia. O ser humano, que é gregário por natureza, deve agir, legislar e governar tendo presente a negociação interior entre aquilo que deseja e a realidade, e entre os seus interesses e os dos outros. Poderá parecer óbvio, mas a tarefa mais importante é também extremamente difícil: consiste em tentar resolver os desequilíbrios que decorrem da repartição desigual de recursos e de possibilidades entre as pessoas. Baseia-se em lutar de igual modo pela nossa felicidade e pela dos outros." - Jorge Bucay


Tu que estás a ler isto, sim tu, arranja uma vida e vive-a...

segunda-feira, 3 de julho de 2017





"A única forma como poderíamos justificar o facto de nos encontrarmos sentados, imóveis, numa cabana triangular nos bosques do norte... era se tivéssemos acabado de passar por um divórcio realmente complicado."   Ian Frazier

"As palavras do autor constituem uma queixa: ele tinha de ter uma justificação para não fazer nada. Ele e os amigos não podiam estar sem fazer nada pelo simples facto de assim o desejarem; tinham de ter uma boa razão, tal como um divórcio! Dessa forma, já podiam justificar essas férias, ou "a perda de tempo valioso" - pois possuíam uma desculpa! Tinham acabado de passar por uma situação dolorosa, e as pessoas hesitariam em criticá-los. O seu sentimento de culpa seria mínimo.

Mas, sabiamente, ignora esse tipo de raciocínio e concede autorização a ele mesmo - sem qualquer necessidade de justificação - para não fazer nada.

As auto-restrições desnecessárias e a falsa sensação de culpa sobrecarregam a grande maioria de nós e afastam-nos dos momentos de paz por que ansiamos. Momentos de sossego para estar a sós não são um requinte opcional; tal como não se destinam apenas aos reformados, aos preguiçosos ou àqueles que têm uma propensão natural para isso. São para todos. E trata-se de um tempo valioso e bem empregue.

E, acima de tudo, não precisa de outra justificação para além do seu nobre objectivo: ficar mais desperto, recordando aquilo de que precisa de se lembrar sobre si e sobre a sua vida." - David Kuntz

domingo, 2 de julho de 2017





"Uma das características das pessoas sãs e fortes é que se dedicam com paixão a tudo o que têm em mãos. Fazem-no, contudo, com lucidez. Sem receio. Desfrutam do seu trabalho e das suas paixões, do cuidado da sua saúde e da dos seus filhos, mas sem se preocuparem. Vivem a vida como se de um jogo se tratasse.

E isso só é possível porque têm muito presente, num plano filosófico, que o essencial é essencial e que tudo o resto são acréscimos sem importância. Sabem muito bem que o essencial é comer, beber e amar a vida e os demais. Desta forma, são capazes de empreender negócios, viagens, relações e todo o tipo de projectos com a atitude de um menino que joga à bola com os amigos. Se conseguirmos um determinado resultado, excelente. Se não o conseguirmos, excelente também. O importante é o processo, a diversão em cada momento.

O felicismo consiste em fazer aquilo que mais lhe agrada em cada momento da sua vida sem pensar demasiado no assunto. E, sobretudo, jogar ao jogo da vida sem o dotar dessa transcendência louca que hoje em dia impregna tudo o que fazemos.

É bom ter desejos, metas e objectivos. Todas as pessoas sãs, incluindo as crianças, sentem o impulso de empreender determinadas tarefas. Mas o mais lógico é que estes projectos sejam vividos como se de um jogo se tratasse.

Se partirmos do pressuposto de que, para sobreviver, as únicas coisas de que precisamos são comida e água, conclui-se que não é necessário fazer mais nada. Podemos trabalhar, esforçar-nos em múltiplas frentes e empresas, mas sempre tendo em consideração que tudo se trata de divertimento: nada que suponha o fim do mundo; nada que suponha o seu princípio!

É bom ter desejos, mas cuidado para não os tornarmos necessidades imperiosas porque esse é um defeito de fabrico do ser humano: transformar simples desejos em necessidades loucas a qualquer altura. Se nos habituamos a beber uma água de determinada marca todos os dias, é muito provável que passemos de dizer: «Adoro a Água da Serra da Estrela» para gritar: «Preciso de Água da Serra da Estrela! Senão não consigo apreciar a refeição!»

Assim é o ser humano. A filosofia budista refere-se a este fenómeno como o «apego», os psicólogos cognitivos, como «conversão de desejos em necessidades absolutas». Só quando aprendermos a não nos apegarmos às coisas nem às pessoas poderemos começar a desfrutar realmente delas." - Rafael Santandreu

sábado, 1 de julho de 2017





"As nossas mentes têm duas posições: olhar para fora e olhar para dentro.

Olhemos agora para dentro.

É considerável a diferença que esta pequena alteração na orientação pode fazer, conseguindo até inverter os desastres que ameaçam o mundo. Quando um número muito maior de pessoas conhece a natureza da sua mente, conhecerá também a gloriosa natureza do mundo em que vive e debater-se-á corajosa e insistentemente para o preservar. É interessante que, em tibetano, a palavra para «budista» seja nangpa, que significa qualquer coisa como «aquele que se recolhe no seu íntimo», ou seja, alguém que procura a verdade não no exterior, mas no interior da natureza da mente. Todos os ensinamentos e instruções do budismo se concentram numa única questão: olhar para a natureza da mente, o que nos liberta do medo da morte e ajuda a compreender a verdade da vida.

Olharmos para dentro exigirá de nós uma grande subtileza e coragem, uma vez que implica uma mudança completa na nossa atitude perante a vida e perante a morte. Estamos tão condicionados a olhar para fora de nós mesmos que perdemos quase por completo o acesso ao âmago do nosso ser. Sentimo-nos aterrorizados em olhar para o interior de nós próprios, porque a nossa cultura não nos deu qualquer ideia do que poderemos encontrar. Somos até mesmo capazes de pensar que, se o fizermos, corremos o risco de enlouquecer. Este é um dos últimos e dos mais astutos artifícios do ego para nos impedir de descobrir a nossa verdadeira natureza.

Então tornamos as nossas vidas tão agitadas que eliminamos o mais pequeno risco de olharmos para dentro de nós mesmos. Até a simples ideia de meditação consegue assustar as pessoas. Quando ouvem as palavras «sem ego» ou «vazio», pensam que experimentar estes estados se assemelha a ser atirado porta fora de uma nave espacial, flutuando eternamente num vazio escuro e arrepiante. Nada pode estar mais longe da verdade. Todavia, num mundo que se dedica à distracção, o silêncio e a tranquilidade apavoram-nos, e nós protegemo-nos deles com ruído e actividades frenéticas. Olhar para a natureza da nossa mente é a última coisa que nos atreveríamos a fazer.

Há alturas em que penso que não queremos colocar nenhuma verdadeira pergunta acerca de quem somos simplesmente porque temos medo de descobrir que existe uma outra realidade para além desta. Que impacto teria esta descoberta perante o modo como temos vivido? Como reagiriam os nossos amigos e colegas ao que passaríamos a saber? O que faríamos nós com o novo conhecimento? Com o conhecimento vem a responsabilidade. Por vezes, mesmo quando a porta da cela se abre escancaradamente, o prisioneiro prefere não escapar." - Sogyal Rinpoche