domingo, 31 de maio de 2015



"Era um safari que estava a quilómetros de distância do meu próprio safari de esforço, onde estavam incluídos os transportes públicos, as infecções de fungos, as pequenas extorsões, os leprosos trocistas, os quartos horríveis, a comida de má qualidade, as explosões de intestinos, os animais em fuga, as salas de aulas em ruínas, os atrasos sem sentido e as ameaças bruscas, do estilo: «Há gente má ali adiante!» ou «Dê-me dinheiro!» Os viajantes do consumo adoram partir de avião para o Malawi, para passar uns dias numa estância à beira-rio, mas no Malawi eu tinha ficado aterrado - como diria um malawiano conhecedor da Bíblia - com os anos que os gafanhotos tinham comido.
Porém, embora eu detestasse incómodos, as dificuldades não me perturbavam; e, se tinha suportado alguns tormentos, também tinha descoberto alguns esplendores, vivido algumas aventuras interessantes e reencontrado amigos. Atravessara diversas fronteiras, fizera um piquenique à beira da Sexta Catarata do Nilo, navegara pelo lago Vitória, remara no Zambeze de Moçambique e passara um dia com o meu velho amigo e actual primeiro-ministro do Uganda. Ao longo do caminho. sempre que alguém me pedia que fizesse um resumo do safari, eu gaguejava e emudecia, porque se tratara menos de uma viagem do que de uma experiência de desaparecimento de circulação, um longo período da minha vida que passara sozinho, improvisando uma viagem pelo mais verde dos continentes. Sentia-me orgulhoso por não poder dizer: «África é maravilhosa!», Os criados eram fixes!» «Fiz uma limpeza de pele no alojamento de caça e Wendy foi à pedicura!» «Comemos guisado de antílope!» «Havia, tipo, uma revolução na capital, e nós não fazíamos a mínima ideia!», ou ainda: «O mordomo preparava-me o banho.»" - Paul Theroux


"Despendendo o tempo e o esforço necessários você pode, se assim o desejar, dominar praticamente qualquer área académica. Mas você não toma essa decisão e tem boas razões para isso. Por que motivo há-de gastar esse tipo de energia do momento presente a resolver problemas obscuros ou a aprender algo que não lhe interessa? Ser feliz, ter uma vida funcional e amar são metas muito maiores. O que interessa realçar é que a inteligência não é algo herdado ou que lhe foi concedido de qualquer outra forma. Você é tão esperto quanto decidir ser." - Wayne Dyer

sábado, 30 de maio de 2015



"Porque será que desejamos tanto ser reconhecidos, ser tidos em boa conta, ser estimulados? Porque será que somos tão snobes? Porque nos agarramos à exclusividade do nosso nome, posição, aquisição? Será que o anonimato é assim tão degradante, e ser-se desconhecido uma coisa muito desprezível? Porque é que perseguimos o que dá fama, o que é popular? Porque não estamos contentes com nós próprios? Será que temos medo e vergonha daquilo que somos, a ponto de o nome, posição e bens se tornarem as coisas mais importantes? É curioso quão forte é o desejo de se ser reconhecido, de ser aplaudido. Na excitação de uma batalha, praticamos actos inacreditáveis, pelos quais somos condecorados; qualquer um se pode tornar herói por ter morto um seu semelhante. Através do privilégio, habilidade, capacidade, eficiência, qualquer pessoa pode chegar perto do topo - com o topo a não ser nunca o topo, já que há sempre, na embriaguez do sucesso, algo mais além." - J. Krishnamurti


"A grande razão que leva as pessoas a África é a possibilidade de avistarem animais perigosos do interior do conforto e da segurança de um Land Rover, com um chapéu ridículo na cabeça e um cartão de registo na mão. No final da excursão, têm de ter registos dos Cinco Grandes no cartão. Eu só consegui assinalar um deles, um tembo cambaleante que avistara por acaso da janela do comboio na Tanzânia. Por muito que me enervasse com o turismo em África, e que troçasse do voyeurismo que consistia em ir importunar os animais ao mato, queria que o meu safari improvisado também incluísse uma semana de observações das criaturas selvagens pelas quais África era famosa. 
Tinha visto tão poucas... Umas hienas famintas em Harar, umas gazelas tímidas no Quénia, um par de girafas trotando, bem como um elefante em passo lento das janelas do Expresso de Kilimanjaro, uns hipopótamos sarapintados no rio Shire, uma avestruz olhando-me com curiosidade no Zimbabué, uns babuínos aqui e ali, aves por todo o lado. Não tinha visto rinocerontes, nem leopardos, nem manadas fosse do que fosse. Mas conseguia compreender o incómodo dos animais, pois também eles pareciam viajantes solitários no mato, e todos eles andavam mais ou menos a fugir. As gazelas tinham fugido, correndo de joelhos bem levantados, no que mais parecia uma corrida de obstáculos.
As criaturas mais perigosas que, até agora, eu tinha visto em África tinham sido os bandidos shifta, que tinham disparado sobre o camião onde eu seguia a norte de Marsabit: homens bravios. As mais exóticas tinham sido as prostitutas ugandesas com a sua plumagem nocturna, sibilando-me convites por trás das árvores da beira da estrada, em Kampala: mulheres bravias." - Paul Theroux

sexta-feira, 29 de maio de 2015



"Vive tudo o que puderes; é um erro não o fazeres. Não interessa tanto o que faças em particular, desde que tenhas a tua vida. Se não a tiveste, então o que tiveste? ... O que se perdeu, perdido está, podes ter a certeza... A altura certa é qualquer altura que tenhas a sorte de ainda ter... Vive!" - Henry James


"Como é fácil destruirmos aquilo que amamos! Com que rapidez se levanta uma barreira a separar-nos, seja ela uma palavra, um gesto, um sorriso! O estado de saúde, o estado de espírito e o desejo lançam sombras, e aquilo que era luminoso torna-se mortiço e opressivo. Desgastamo-nos através do que fazemos, e aquilo que era nítido e claro vai ficando entediante e confuso. Através da fricção constante, do querer e da frustração, aquilo que era belo e simples passa a estar assustado e apreensivo. O relacionamento é complexo e difícil, e poucos saem dele ilesos. Embora gostássemos que fosse uma coisa estática, resistente, contínua, o relacionamento é um movimento, é um processo que tem de ser profunda e totalmente compreendido, e não forçado a adaptar-se a um padrão interior ou exterior. O ajustamento, que constitui a estrutura social, perde o seu poder e autoridade quando existe amor. O amor no relacionamento é um processo purificador porque revela os caminhos do «eu». Sem tal revelação, o relacionamento tem pouco significado.
Mas lutamos tanto contra essa revelação! A luta assume várias formas: dominação ou subserviência, medo ou esperança, ciúme ou aceitação. A dificuldade está em que nós não amamos; e, se amamos, queremos que isso funcione de uma determinada forma, não lhe damos liberdade. Amamos com as nossas mentes, e não com os nossos corações. A mente pode modificar-se a si mesma, o amor não. A mente pode tornar-se invulnerável, o amor não; a mente pode sempre isolar-se, ser exclusiva, tornar-se pessoal ou impessoal. O amor não pode ser comparável nem delimitado." - J. Krishnamurti

quinta-feira, 28 de maio de 2015



"Tanto tempo passado, era o regresso à agricultura de sobrevivência. Este modo de vida em África era-me familiar. A impressão mais forte com que eu estava era, não tanto a de que nos locais que eu conhecia se vivia pior, mas a de que esses locais não tinham mudado. Após quarenta anos de experiências com várias ideologias e indústrias, regressavam à agricultura à mão, triturando o milho para fazer farinha, vivendo de papas de aveia e feijão. Tudo era como antigamente; simplesmente, havia mais pessoas, os edifícios estavam mais sujos, havia mais lixo, menos árvores, mais caçadores furtivos, menos caça." - Paul Theroux
"Se você for feliz, se aproveitar ao máximo cada momento, então é uma pessoa inteligente. A capacidade de resolver problemas é uma óptima aliada da sua felicidade mas se você souber que, ainda que comprovada a sua incapacidade de resolver um dado problema, pode, mesmo assim, escolher a felicidade ou, pelo menos, recusar escolher a infelicidade, você é inteligente. E é inteligente porque detém a arma suprema contra o grande E.N. Sim, refiro-me ao Esgotamento Nervoso.
Talvez se surpreenda ao saber que os esgotamentos não existem. Os nervos não se esgotam. Abra alguém ao meio e procure os nervos exaustos; estes nunca aparecem. As pessoas "inteligentes" não têm E.N. porque detêm as rédeas de si próprias. Conseguem escolher a felicidade em detrimento da depressão pois sabem como lidar com os problemas das suas vidas. Note-se que eu não afirmei que elas resolvem os problemas; em vez de medirem a sua inteligência baseando-se na sua capacidade de resolver o problema, estas pessoas avaliam-na fundamentando-se na sua capacidade de se manterem felizes e com dignidade, seja ou não o problema resolvido.
Por conseguinte, pode começar a considerar-se inteligente tendo como base o modo como escolhe sentir-se perante circunstâncias adversas. As lutas das nossas vidas são basicamente as mesmas; todas as pessoas que se relacionam com outros seres humanos num contexto social passam por dificuldades semelhantes: discórdias, conflitos, cedências fazem parte da natureza humana. Da mesma forma, dinheiro, velhice, doenças, mortes, desastres naturais e acidentes são, todos eles, acontecimentos que levantam problemas a praticamente todos os seres humanos. Porém, algumas pessoas conseguem ultrapassá-los, evitar, apesar destas ocorrências, a depressão paralisadora e a infelicidade enquanto outras deixam-se abater, tornam-se apáticas ou têm um E.N. Aqueles que aceitam os problemas como fazendo parte da condição humana e que não medem a felicidade em termos de ausência de problemas pertencem à espécie mais inteligente de seres humanos - e também à mais rara - que conhecemos." - Wayne Dyer

quarta-feira, 27 de maio de 2015



"A «respeitabilidade»é uma maldição, é um mal que corrói a mente e o coração. Insinua-se sem se dar por ela e destrói o amor. Ser «respeitável» é sentir-se com sucesso, é fabricar para si mesmo uma posição no mundo, é construir à sua volta um muro de certezas, dessas certezas que vêm com o dinheiro, o poder, o sucesso, a capacidade ou a virtude. Essa exclusividade arrogante alimenta o ódio e o antagonismo nas relações humanas, que constituem a sociedade. Aquele que é «respeitável» faz sempre parte da nata da sociedade e, assim, ele é sempre causador de perturbação e infelicidade. Aquele que é «respeitável», assim como o que é desprezado, está sempre à mercê das circunstâncias; as influências do exterior e o peso da tradição são para eles de excepcional importância, pois elas escondem a sua pobreza interior. Eles estão na defensiva, cheios de medo e desconfiados. O medo mora nos seus corações, portanto a intolerância rege as suas vidas; a «virtude» e a «piedade» são as suas armas. São como o tambor, vazios por dentro e barulhentos quando batidos. Aqueles que são «respeitáveis» nunca poderão estar receptivos à Verdade, pois, assim como os desprezados, eles estão encerrados na vontade de melhoria pessoal. A felicidade é-lhes negada, porque eles evitam a verdade.
Ser generoso com a mão é uma coisa, mas ser generoso com o coração é outra. A generosidade da mão é uma coisa bastante simples, dependendo do padrão cultural de cada um; mas a generosidade do coração é algo de um significado muito mais vasto, exigindo grande observação e compreensão. Diferente da generosidade do coração, a generosidade da mão é um movimento para fora, mas muitas vezes é doloroso, enganador e egocêntrico. A generosidade da mão é fácil de praticar; mas a generosidade do coração não é uma coisa que se cultive, é libertação em relação a toda e qualquer acumulação. Para se perdoar, tem de haver uma ferida; e para se ser ferido tem de haver acumulações de orgulho. Não há qualquer generosidade do coração enquanto houver uma memória identificadora, um «eu» e um «meu»." - J. Krishnamurti


"O comboio era a única maneira eficaz de entrar e sair de Tabora. O caminho-de-ferro era o elo de ligação entre esta cidade - de bom tamanho, mas em ruínas - e a capital, situada a mil e duzentos e quilómetros de distância. Décadas de negligência tinham deixado as estradas da Tanzânia em péssimo estado, muitas delas inutilizáveis. As excepções eram, como sempre, as estradas para turistas. É muito natural que os palermas dos safaris, que andam de calças de equitação de caqui e capacete, e atravessam o país de Land Rover para irem espantar-se com os javalis na cratera do Ngorongoro, se maravilhem com a modernidade da Tanzânia - óptimos hóteis, estradas excelentes, vida animal em grande forma. Mas um pescador sukuma que deseje descer a Shinyanga - que fica apenas a cem quilómetros de distância - para vender o peixe que apanhou terá grande dificuldade em encontrar uma estrada transitável, já para não para falar de um veículo, e é-lhe impossível chegar a Tabora, excepto por meio deste comboio do mato." - Paul Theroux

terça-feira, 26 de maio de 2015



"A essência da grandeza consiste na capacidade de escolhermos a realização pessoal em circunstâncias em que os outros optam pela loucura.

Olhe por cima do seu ombro e encontrará um companheiro de todas as horas. À falta de melhor nome, chamemos-lhe A-Sua-Própria-Morte. Você pode optar por temê-la ou por tirar partido dela. A escolha é sua. 
Sendo a morte uma proposta de contornos tão infinitos e a vida tão breve que mal temos tempo para respirar, vale a pena você interrogar-se: «Será que devo evitar fazer as coisas que realmente quero fazer?»; «Será que devo viver a minha vida segundo os ditames dos outros?»; «Será que é importante acumular coisas?»; «Será que adiar é a forma certa de se viver?». O mais provável é que as suas respostas redundem nestas simples palavras: Vive... Sê tu próprio... Usufrui... Ama.
Você pode recear a sua própria morte, sem disso tirar qualquer proveito, ou optar por utilizá-la como aliada na aprendizagem de uma vida funcional." - Wayne Dyer


"Renunciar ao mundo da riqueza, do conforto e da posição social é relativamente simples; mas pôr de lado a ânsia de ser, de «vir a ser» exige muita inteligência e compreensão. O poder que a riqueza proporciona é uma barreira à compreensão da Verdade, assim também acontece com o poder do talento e da capacidade. Esta forma particular de confiança é obviamente uma actividade do «eu»; e, ainda que seja difícil, é possível anular esta forma de certeza e de poder. Mas o que é mais subtil e está mais oculto é o poder e o impulso existentes no forte desejo de «vir a ser». A expansão do «eu», sob qualquer forma, seja através da riqueza material ou através da «virtude», é um processo conflituoso, causador de antagonismo e confusão. Uma mente pressionada pelo «vir a ser» nunca poderá estar tranquila, pois a tranquilidade não resulta nem de exercícios nem do tempo. O «vir a ser» gera a noção do tempo, o que, de facto, adia a compreensão. O «eu serei» é uma ilusão que nasce da arrogância pessoal." - J. Krishnamurti

segunda-feira, 25 de maio de 2015



"Um enorme grupo de crianças jogava à bola sob as luzes. Não era propriamente um jogo de futebol, mas era um jogo empenhado, com gargalhadas e gritos, que me chamou a atenção. África estava cheia de crianças escanzeladas e cheias de energia, que guinchavam enquanto brincavam, e a brincadeira estava normalmente relacionada com chutos e uma bola. Estas crianças não tinham uma bola redonda de borracha, mas uma bola de trapos toda desengonçada. O campo não era plano, nem macio - era uma sucessão pedregosa de pilhas de lixo e buracos. As crianças brincavam descalças, umas vinte ou mais, sem formarem equipas, mas todos à uma.
Ao vê-las brincar e chamar-se umas às outras nesta noite quente, erguendo nuvens de pó sob as luzes do pátio da estação, eu senti-me impressionado pelo esforço que investiam e encorajado pela sua alegria. O campo de jogos era um baldio, parte do qual se encontrava às escuras. As crianças entravam e saíam das sombras guinchando. Pouco lhes importava a escuridão, pouco lhes importava o campo pedregoso, ou a bola a desmanchar-se. Estas crianças brincavam e riam-se na que era, sem sombra de dúvida, uma das mais desesperadas províncias de um país semiabandonado. Mesmo depois de ter soado o apito do motor e de termos começado a afastar-nos de Mwanza, eu continuei a ouvir-lhes as gargalhadas de sino, e foi então que percebi por que motivo me sentira tão fascinado por aquela felicidade, que me fizera sentir tão só." - Paul Theroux


"Quero viajar até onde puder,
Quero alcançar, da minha alma, o prazer,
E transformar as limitações que conhecer
E sentir-me, em mente e espírito, crescer;

Quero viver, existir, "ser", enfim,
E escutar as verdades dentro de mim." - Wayne Dyer

domingo, 24 de maio de 2015



"Prémio e castigo só existem quando está ausente a humildade. A humildade não é produto de práticas espirituais ou de renúncias. A humildade não é algo que se atinge, não é uma virtude que se cultive. A virtude que é cultivada deixa de ser virtude, pois passa a ser uma outra forma de aquisição, um recorde a atingir. A virtude cultivada não é a negação do «eu», mas sim a afirmação negativa do «eu».
A verdadeira humildade desconhece a divisão entre o superior e o inferior, entre mestre e discípulo. Enquanto houver uma divisão entre o mestre e o discípulo, entre a realidade e nós mesmos, a compreensão não é possível. Na compreensão da Verdade não há nenhum mestre e nenhum discípulo, não há o que vai à frente nem o que está atrasado. A Verdade é a compreensão de o que é, momento a momento, sem o fardo ou o resíduo do momento que passou. 
Se o mestre existe ou não, que importa isso? Só é importante para quem explora os outros, para as escolas e sociedade secretas; mas para o homem que procura a Verdade que traz suprema felicidade, certamente que a questão é completamente irrelevante. O homem rico e o trabalhador assalariado são tão importantes como o mestre e o discípulo. Se os mestres existem ou não, se há distinções entre iniciados e discípulos, isso não é importante; o importante é cada um compreender-se a si mesmo. Sem autoconhecimento, o pensamento - o instrumento com que se raciocina - não tem base alguma. Sem primeiro nos conhecermos, como podemos nós saber o que é verdadeiro? Quando não há autoconhecimento, é inevitável a ilusão. É uma infantilidade quando alguém nos diz que somos isto ou aquilo. Cuidado com quem nos oferece uma recompensa, neste mundo ou no próximo!" - J. Krishnamurti 


"Atravessei uma multidão de pessoas que tinham ido esperar o ferry, a chegada irregular da embarcação era um dos pontos altos da vida de Mwanza. Ao percorrer a cidade, percebi porquê. Era um local abandonado, uma série de lojas vazias numa rua de terra batida, quase intransitável devido ao estado em que se encontrava. Os velhos autocarros oscilavam, quase se voltando quando as rodas se enfiavam nos buracos fundos. Era outro posto de fronteira assombrado, outro local deprimente e, ao mesmo tempo, interessante, que os turistas de safaris, que fugiam para o aeroporto internacional de Arusha, nunca veriam, embora vissem animais selvagens e nativos de vestes coloridas." - Paul Theroux

sábado, 23 de maio de 2015



"É verdade que a viagem é o mais triste dos prazeres, os blues da longa distância por terra. Mas também pensei naquilo que me atormentara ao longo da viagem, como um mantra de construção de aborrecimento na minha cabeça, palavras que nunca escrevi. As pessoas da Terra são, na sua maioria, pobres. Os sítios estão, na sua maioria, arruinados e nada impedirá essa ruína de piorar. A viagem dá-nos vislumbres do passado e do futuro, os nossos e os de outras pessoas. «Sou natural deste mundo», aspirando a ser o Homem da Guitarra Azul. Mas há demasiadas pessoas e uma quantidade enorme delas passa os seus dias de fome a pensar nos Estados Unidos como Nave Mãe. Eu podia ser um tailandês feliz, mas não há vida na Terra para que esteja menos talhado do que a de um indiano, rico ou pobre. A maioria do mundo está a piorar, a encolher para se tornar uma desolação estragada. Só os velhos podem ver realmente como o mundo está a envelhecer sem graça e tudo o que perdemos. Os políticos são sempre inferiores aos cidadãos. Ninguém na Terra é bem governado. Há esperança? Sim. As pessoas que conheci, em encontros casuais, eram, na sua maioria, estranhos que me ajudaram no meu caminho. E nós, fantasmas felizes, podemos viajar para onde quisermos. Ir ainda é bom, porque as chegadas são partidas." - Paul Theroux

sexta-feira, 22 de maio de 2015



"O pensamento, com o seu conteúdo emocional e sensitivo, não é amor. O pensamento impede, invariavelmente, o amor. O pensamento baseia-se na memória, e o amor não é memória. Quando pensamos sobre alguém que amamos, esse pensamento não é amor. Podemos recordar os hábitos de um amigo, os seus gestos, idiossincrasias, os incidentes agradáveis e desagradáveis da relação com ele, mas as imagens que o pensamento evoca não têm a ver com o amor. Pela sua própria natureza, o pensamento separa. A noção de tempo e espaço, de separação e dor nasce do processo do pensamento, e só quando este cessa é que pode existir o amor.
O pensamento alimenta inevitavelmente o sentimento de posse, dessa possessividade que, consciente ou inconscientemente, cultiva o ciúme. É óbvio que, onde há ciúme, não existe amor; no entanto, para muita gente o ciúme é uma indicação de amor. O ciúme é resultado do pensamento, é a reacção do conteúdo emocional do pensamento. Quando o sentimento de possuir, ou de ser possuído, é bloqueado, há um tal vazio, que a inveja toma o lugar do amor. É por o pensamento desempenhar o papel do amor, que surgem tantas complicações e mágoas." - J. Krishnamurti


"E quem era eu? Um mzungu (branco) mal vestido como outro qualquer, que detestava andar de avião e queria ir para Mwanza de barco. Aqui, como noutros sítios, eu era o único viajante mzungu. Os outros não apanhavam autocarros, tinham receio do Sudão e da Etiópia, mantinham-se nas rotas seleccionadas e viajavam em grupo, para irem observar animais. Em regra, mantinham-se a grande distância da população. E, no entanto, embora fosse um solitário, eu estava sempre a ouvir dizer karibu, karibu, bem-vindo, bem-vindo, e «Não quer mais ugali?»" - Paul Theroux

quinta-feira, 21 de maio de 2015



"A melhor viagem não era uma simples viagem de comboio nem sequer toda uma colecção delas, mas algo mais extenso e mais complexo: uma experiência da quarta dimensão, com paragens e arranques e trechos monótonos, períodos de doença e recuperação, perdas de tempo e ter de correr e depois ter de esperar, com o súbito fenómeno de felicidade como recompensa episódica.
Algumas viagens não implicavam locomoção, mas antes períodos de residência e reflexão, descrever órbitas imponderáveis, como quando me tornei quase invisível e parecia dissolver-me, outra vez a parecer um fantasma, num local agradável, versão aromática de casa, dias de trabalho e pensamento em que me mantinha como um monge na minha cabeça, sem consciência do exótico - dias em que saía do quarto de hotel para uma ruela asiática apinhada, como se tivesse sido projectado para ali como «transferência de matéria» por uma luz quente, surpreendido por ver um bazar, riquexós e vendedores de rua escanzelados, belas raparigas a olhar, e eu a rir-me: Que estou a fazer aqui?
Acabara por ver que a viagem, para mim, já não era um interlúdio de procura de divertimento, nem sequer o desvio sinuoso de me dirigir a casa, mas um modo de viver a vida: uma viagem sem fim em que o único destino era a escuridão. A beleza disso era que estava a fazê-lo do modo mais simples, como um sem-abrigo com uma pequena mala e uma pasta de papéis, a roçar pelo mundo, a viajar leve." - Paul Theroux


"É estranha a semelhança que há entre a maledicência e as preocupações. Ambas são produto de uma mente inquieta. A mente inquieta tem de ter sempre uma variedade mutável de expressões e de acções, tem de estar ocupada; tem de ter sempre muitas sensações, interesses passageiros - e a maledicência contém tudo isso.
A maledicência é a verdadeira antítese da intensidade de entrega. Falar sobre os outros, agradavelmente ou com maldade, é uma fuga a si próprio, e a fuga é a causa da inquietação. A fuga, na sua própria natureza, é desassossego. O interesse nos assuntos dos outros parece ocupar a maioria das pessoas, e esse interesse vê-se pela leitura de inúmeras revistas e jornais, com as suas colunas de mexericos, assassinatos, divórcios e tudo o mais.
Se não estivermos preocupados, a maioria de nós sentirá que não está viva; lutar com um problema é, para muitos, a demonstração de que existem. Não somos capazes de imaginar a vida sem um qualquer problema; e quanto mais estamos ocupados com um problema, mais vivos pensamos estar. A tensão constante provocada por um problema, que o próprio pensamento criou, leva ao embotamento da mente, tornando-a insensível e exausta.
Porque há essa preocupação incessante com um problema? Será que a preocupação vai resolver o problema? Ou será que a solução do problema chega quando a mente está tranquila? Mas, para muitas pessoas, uma mente tranquila é uma coisa muito temível; elas têm receio de estar tranquilas, pois sabe-se lá o que poderão descobrir nelas próprias; estarem preocupadas é para elas uma coisa preventiva. A mente que tem receio de descobrir está sempre na defensiva, e a inquietude é a sua defesa." - J. Krishnamurti

quarta-feira, 20 de maio de 2015



"Em África, porém, ninguém era vaidoso devido à longevidade, porque a noção de longevidade praticamente não existia. Ninguém vivia muito tempo, pelo que a idade não importava, e talvez isso explicasse o modo descontraído como os Africanos lidavam com o tempo. Em África, ninguém vivia tempo suficiente para realizar alguma coisa digna de nota, ou para ver completada qualquer tarefa de peso. Duas gerações no Ocidente equivaliam a três gerações no tempo africano, vistas ao telescópio pelo facto de as pessoas se casarem cedo, terem filhos cedo e morrerem cedo." - Paul Theroux


"Detesto grandes cidades, provavelmente pelas mesmas razões porque muita gente da cidade detesta o campo (que eu adoro), porque as acho vertiginosas, ameaçadoras, monocromáticas, isolantes, cansativas, cheias de micróbios, eriçadas de sombras movimentadas e de odores ambíguos. E as multidões, e todo o espaço partilhado. As cidades parecem-me cemitérios monstruosos, os edifícios como que cemitérios taciturnos. Sinto-me sozinho e perdido nas necrópoles iluminadas, nauseado com os fumos do trânsito, enojado com os cheiros da comida, intrigado com os rostos e o frenesim banal. 
Quando os utópicos citadinos sofisticados elogiam as suas cidades dá-me vontade de rir. Fartam-se de apregoar museus e jantares, as diversões maníacas, os zoos, a energia das ruas, e que conseguem comprar uma pizza às três da manhã. Adoro ouvi-los competir: a minha grande cidade é melhor do que a sua grande cidade! Nunca mencionam as multidões horríveis, o ar imundo, o barulho imenso, os sinais de fraqueza, sinais de infortúnio, nem o facto de numa grande cidade nunca ser escuro nem estar silêncio. E empoleiram-se como passarinhos sem penas no confinamento dos seus apartamentos altos, sempre a olhar para baixo, para o pavimento, só capazes de se deslocar no malcheiroso assento traseiro de um táxi lento conduzido por um taxista mal-humorado." - Paul Theroux 

terça-feira, 19 de maio de 2015



"Por que razão nos identificamos com uma outra pessoa, com um grupo, com um país? O que nos leva a chamarmo-nos Cristãos, Hindus, Budistas, ou por que motivo nos ligamos a qualquer uma das inumeráveis seitas? Religiosa e politicamente identificamo-nos com este ou aquele grupo através da tradição, do hábito, do impulso, do preconceito, da imitação ou da passividade. Esta identificação acaba com toda a compreensão criativa e, assim, tornamo-nos um mero instrumento nas mãos do chefe de partido, do padre ou do líder mais em moda.
Quando nos identificamos com outra pessoa, será isso uma indicação de amor? Será que a identificação implica vivenciar? Não será que a identificação põe um fim ao amor e ao vivenciar? Certamente que identificação é possuir, é afirmação de posse; e a posse impede o amor, não é verdade? Possuir é sentir-se seguro; possuir é uma defesa, é tornar alguém invulnerável. Na identificação há resistência, grosseira ou subtil; e será o amor uma forma de resistência autoprotectora? Existirá amor quando se está na defensiva?
O amor é vulnerável, flexível, receptivo; é a mais alta forma de sensibilidade, e a identificação produz insensibilidade. A identificação e o amor não andam juntos, pois um destrói o outro. A identificação é essencialmente um processo do pensamento através do qual a mente se resguarda e se expande; e, ao tornar-se em alguma coisa, ela vai resistir e defender-se, vai possuir e descartar. Nesse processo de «vir a ser», a mente, o eu torna-se mais duro e poderoso; mas isso não é amor. A identificação destrói a liberdade, e só em liberdade pode existir a mais alta forma de sensibilidade." - J. Krishnamurti


"Não é só aqui que os homens são uns animais; esta cena poderia ter-se passado em qualquer ponto do mundo. Mas leprosos, hienas, presas de marfim e lixo, burros queixosos, esgotos a céu aberto em vielas de paralelepípedo, o cheiro das especiarias, o talhante coberto de sangue erguendo o cutelo para abrir ao meio uma bossa coberta de pêlo, dando a ver o queijo macio da gordura interior e sorrindo de esguelha enquanto a oferece, os gemidos das orações, o convite de uns olhos sombrios para o interior de uma palhota às escuras, os «Estrangeiro!» guinchados - tudo isto explicava por que motivo Rimbaud fora tão feliz aqui. Ele gostara de África por ser anti-Europa, anti-Ocidente - como de facto é, umas vezes em tom de desafio, outras vezes preguiçosamente. Eu gostava dela por essas razões, porque nada havia aqui de familiar. Estar em África era como estar numa estrela negra." - Paul Theroux

segunda-feira, 18 de maio de 2015



"A ideia do viajante é de que o barbarismo é uma coisa singular e estrangeira que se encontra do outro lado do mundo, nalgum local recôndito, isolado e provinciano. O viajante desloca-se a esse local remoto e parece ser assim: é-lhe dado um vislumbre das piores atrocidades que podem ser praticadas por um Governo sádico. E depois, para sua vergonha, percebe que são idênticas às que são defendidas e diligentemente aplicadas pelo seu próprio Governo. Quanto à hipocrisia das pessoas que parecem cegas para o facto de o assassínio em massa ainda ser um acontecimento anual, olhem para o Camboja, para o Ruanda, para o Darfur, para o Tibete, para a Birmânia e para outros sítios - o grito mais verdadeiro não é «Nunca mais» mas «Cada vez mais»." - Paul Theroux


"Qualquer forma de ambição - seja ela em nome de um grupo, da salvação individual ou da realização espiritual - é acção adiada. O desejo está sempre no futuro; o desejo de «vir a ser» é ausência de acção no presente. O agora tem muito mais importância do que o amanhã. No agora está todo o tempo, e compreender o agora é ficar liberto do tempo. O «vir a ser» é a continuidade do tempo, do sofrimento. O «vir a ser» não é. Ser está sempre no presente, e ser é a mais alta forma de transformação. O «vir a ser» é simplesmente a continuidade modificada, e só existe transformação no presente, no ser." - J. Krishnamurti

domingo, 17 de maio de 2015



"O desejo de desaparecer é a mola que impele muitos viajantes. Se a pessoa estiver completamente farta de que a mandem esperar, seja em casa ou no emprego, o ideal é ir viajar: serem as outras pessoas a esperar por ela, para variar. Ir viajar é uma espécie de vingança por nos terem deixado à espera, por termos de deixar mensagens em gravadores, sem sabermos o número da extensão da outra pessoa, por termos de passar grande parte da nossa vida activa à espera - ou seja, pelas coisas irritantes a que estamos sujeitos presos em casa. Mas a verdade é que esperar faz parte da condição humana.
O facto de toda gente estar disponível a qualquer momento neste mundo totalmente acessível dava-me uma sensação de puro horror. Dava-me vontade de encontrar um sítio que fosse absolutamente inacessível... sem telefones, sem faxes, sem correio sequer, um mundo maravilhoso, um mundo antigo inalcançável; em suma, um mundo distante." - Paul Theroux


"Por vezes é assim, na viagem, quando a viagem se torna o seu oposto: anda-se, anda-se, e depois fica-se numa paragem no meio de parte nenhuma. Em vez de se tomar uma decisão consciente, deixa-se, simplesmente, de andar.
Já tinha acontecido e eu sabia porquê. «Numa certa época da nossa vida acostumamo-nos a considerar qualquer sítio como o sítio possível para uma casa» - escreveu Henry T. em Walden. Para o viajante, essa época nunca acaba. Todavia, eu sabia o que tinha a fazer." - Paul Theroux

sábado, 16 de maio de 2015



"Os Africanos, menos estimados do que nunca, parecem-me ser as pessoas do mundo a quem mais se mente - são manipulados pelos próprios governos, queimados pelos especialistas estrangeiros, iludidos pelas instituições de solidariedade e enganados em tudo. Qualquer chefe africano era um ladrão, mas os evangélicos roubaram ao povo a inocência e as organizações não-governamentais deram-lhe falsas esperanças, o que ainda é pior. Os Africanos reagiram arrastando os pés ou tentando emigrar; ou pedindo, suplicando, exigindo dinheiro e presentes com a insolente e bizarra sensação de quem tem direito a eles. É verdade que África não é toda igual. É um sortido de repúblicas heterogéneas e dirigentes gastos. Adoeci, perdi-me, mas nunca me entediei: na verdade, a minha viagem foi uma delícia e uma revelação." - Paul Theroux



"Sejamos realistas: no fundo de cada um de nós vive um «rezinga» interior. Debatemo-nos regularmente com as formas como nós, as pessoas decentes, respeitosas e sensíveis deste planeta, podemos viver com alguma tranquilidade num mundo cheio deles - os arrogantes, incompetentes, desrespeitosos, malformados e intratáveis. No entanto, muitas vezes o inimigo está dentro de nós. Penso que é muito mais produtivo que nos concentremos nos nossos próprios pensamentos e acções do que nos demais. Afinal, eles já nos obrigam a pensar demasiado nos seus problemas, não acha?
Eu acredito que sou uma boa pessoa e tento dar o meu melhor todos os dias. Aposto que você faz o mesmo. No entanto, à medida que dou conta de como somos prejudicados pelas outras pessoas, deparei com um facto não muito agradável: eu próprio tenho um pouco das características negativas implícitas em cada uma dessas pessoas. Alguns dos meus amigos, dos meus familiares e dos meus parceiros de trabalho poderiam atestar que, afinal, até tenho mais do que apenas «um pouco».
Sei que já magoei outras pessoas, que já disse coisas que não deveria ter dito e que fiz coisas que não deveria ter feito, já cometi inúmeros erros, já fui precipitado, insensato e egoísta. E a lista de defeitos não fica por aí...
Se só o amigo a quem falei mal, o patrão ao qual não dei o meu melhor e o amigo cujas chamadas não devolvi, dessem a sua opinião sobre mim, eu seria visto como um verdadeiro intratável.
Por isso independentemente de quem somos, e de todas as nossas tentativas bem-intencionadas, somos uma mistura de variadíssimos elementos, de coisas das quais gostamos, de outras que toleramos e de outras que gostaríamos que desaparecessem. Mas não é essa variedade de características que faz de nós pessoas más. É precisamente o que nos torna humanos. Como disse Zorba, o Grego: «Eu sou toda a catástrofe.»
Uma das razões pelas quais é importante olharmos para o espelho e encararmos as nossas limitações é que, ao fazermos isso, nos tornamos, forçosamente, mais tolerantes para com os defeitos das outras pessoas. Quando temos uma pessoa difícil na nossa vida, é bom que tomemos consciência de que essa pessoa está apenas a ser humana. Se calhar preferia que essa pessoa fosse ser humana para outro lado, mas... a vida é assim mesmo.
Outra vantagem de sermos tolerantes é a nossa liberdade, a liberdade de nos sentirmos menos irritados, a libertação de mágoas ou de um cérebro cheio de fantasias de vingança, a liberdade de seguir em frente e de desfrutar das coisas boas da vida, e de nos podermos concentrar no que a vida tem de melhor...
Não nos irritarmos não significa que não actuemos quando é necessário ou importante. Quando falo em não nos irritarmos, não estou a desculpar comportamentos destrutivos ou negativos, nem a sugerir que você o faça. Estou, sim, a sugerir que vá assimilando as estratégias, enquanto, ao mesmo tempo, continua a defender o que considera ser correcto e a evitar comportamentos negativos. Ao fazê-lo, penso que a sua vida será mais rica em paz e tranquilidade.
Amigos «rezingas», como conseguimos viver num mundo cheio de gente incompetente, desrespeitosa, arrogante e malformada - por outras palavras, pessoas que, por vezes, agem da mesma forma que nós? Perdoando a nós próprios, e, ocasionalmente, a certas pessoas demasiadamente «humanas» com as quais nos cruzamos, essas falhas de carácter..." - Richard Carlson

sexta-feira, 15 de maio de 2015



"As vibrações negativas que senti não eram imaginárias. Eram o efeito dos campos mal tratados e das choupanas estragadas, mas acima de tudo eram o efeito do rosto das pessoas, um distinto desarranjo das feições. Muitas vezes, num país pobre, o rosto dos velhos, e especialmente os seus olhos, tem um ar de terror. Também pode ser um ar de fadiga e resignação, e, subjacente a isso, um rosto torturado, um rosto que viu horrores. E também o rosto das velhas, mas as mulheres desses sítios são estoicas e resignadas à violência; os homens parecem mais fracos e mais profundamente feridos." - Paul Theroux


"- Quando se chega à conclusão de que uma coisa é inevitável, tudo o que se pode fazer é aproveitá-la ao máximo.
- Pois eu diria que a verdadeira sabedoria consiste em alcançar um equilíbrio entre as exigências do corpo e as exigências do espírito.
- É precisamente isso que os hindus defendem que nós, os ocidentais, ainda não fizemos. Eles pensam que nós, com as nossas inúmeras invenções, as nossas fábricas, as nossas máquinas e tudo o que elas produzem, procuramos a felicidade nas coisas materiais, mas que a felicidade não se encontra aí, mas sim nas coisas espirituais. E pensam também que o caminho por nós escolhido conduz à destruição.
- E você considera a América um local adequado para praticar as ditas virtudes que mencionou?
- Vocês, os Europeus, não sabem nada sobre a América. Como acumulamos grandes fortunas, julgam que só nos importamos com o dinheiro. Mas nós não queremos saber dele para nada; assim que o temos, gastamo-lo, umas vezes bem, outras mal, mas gastamo-lo. O dinheiro não significa nada para nós; é simplesmente o símbolo do sucesso. Nós somos os grandes idealistas do mundo; o que eu penso é que colocámos o nosso ideal nos objectos errados; creio que o maior ideal que o homem se pode propor alcançar é a autoperfeição.
- Um ideal muito nobre.
- E não valerá a pena tentar estar à sua altura?
- Mas será que você acredita por um momento que seja que você, um só homem, consegue ter algum efeito sobre um povo tão truculento, tão azafamado, tão pouco respeitador das leis e tão intensamente individualista como é o americano?
- Mas posso tentar. Um só homem inventou a roda. Um só homem descobriu a lei da gravidade. Tudo o que acontece produz os seus efeitos. Se atirarmos uma pedra a um lago, o universo já não é exactamente o mesmo que era antes. É um erro pensar que aqueles homens santos da Índia levam vidas inúteis. Eles são uma luz a brilhar na escuridão. Eles representam um ideal que é um refrigério para os seus semelhantes; os homens comuns poderão nunca vir a alcançá-lo, mas respeitam-no e ele afecta as suas vidas para sempre. Quando um homem se torna puro e perfeito, a influência do seu carácter espalha-se para que aqueles que buscam a verdade sejam naturalmente atraídos para ele. Pode acontecer que, se eu levar a vida que planeei, ela possa afectar os outros; o seu efeito poderá não ser maior do que a ondulação causada por uma pedra atirada à água, mas uma onda causa outra e essa uma terceira; é bem possível que algumas pessoas vejam que o meu modo de vida oferece felicidade e paz e que, por sua vez, ensinem a outros o que aprenderam." - Somerset Maugham 

quinta-feira, 14 de maio de 2015



"Tal como muitos condutores, eu também costumava aborrecer-me sempre que «falhava» um sinal. Chegava a imaginar ajustes de contas com o tipo que circulava à minha frente apenas à velocidade máxima permitida e me deixava «pendurado» atrás da luz vermelha. Mas não, eu não ficava nesse estado por estar a tentar chegar à maternidade com a minha mulher prestes a dar à luz; esse era o meu estilo de condução.
Um dia, porém ouvi Thich Nhat Hanh, um brilhante monge budista, dizer que adorava luzes vermelhas e engarrafamentos, porque lhe proporcionavam a oportunidade de respirar profundamente e agradecer. 
Agradecer? Engarrafamentos e luzes vermelhas? Demorei algum tempo a compreender, mas penso que se trata de agradecer pela pausa, por termos um momento para nós, e, com ele, a oportunidade de recuperar uma tranquilidade consciente no meio de uma vida de azáfama constante. Entretanto, também descobri que muitas pessoas com vidas extremamente atarefadas têm hábitos semelhantes, e aproveitam não só as luzes vermelhas dos semáforos, como também os momentos de espera ao telefone, ou num elevador que pára em todos os andares. Essas pessoas sentem que os vário tipos de pausas constituem uma oportunidade para, por momentos, se libertarem de uma vida de actividade ininterrupta e se virarem um pouco para o interior. A melhor forma de fazer isto é respirando lenta e profundamente. Em vez de praguejar contra o universo pelo facto de colocar tantos obstáculos no seu caminho, agradeça ao destino essas pausas tão necessárias.
Hoje em dia, também tiro partido dos meus encontros com as pessoas difíceis com quem tenho de contactar regularmente. Quando vejo que se aproximam, ou quando me encaminho para ir ao seu encontro, faço uma pequena pausa para respirar. Por vezes chego a fazê-lo na sua presença - a vantagem de respirar para me acalmar é que as pessoas pensam que estou apenas a respirar.
Respirar algumas vezes, lentamente, a partir do abdómen, faz com que os seus ombros se descontraiam, os seus pensamentos se suavizem, e, vai ser invadido por uma onda de bem-estar. Ora este estado é o ideal quando temos de lidar com pessoas difíceis e é de tal forma agradável que pode dar por si a ansiar por um desses encontros, ou pelas luzes vermelhas dos semáforos, ou pelos engarrafamentos." - Richard Carlson


"O grande desafio na viagem não é chegar à fascinante cidade estrangeira, mas resolver o problema da partida, arranjando maneira de sair de lá sem voar. Normalmente, os autocarros são imundos e as estações rodoviárias de todo o mundo são covis de ladrões, carteiristas, intimidadores, charlatães e assaltantes. Os carros de aluguer são convenientes, mas quase sempre um mau negócio, e quem está para aturar as histórias do motorista? 
O comboio ainda é o ideal - aparece-se e salta-se lá para dentro." - Paul Theroux

quarta-feira, 13 de maio de 2015



"Nada no mundo é permanente e, se somos tolos quando desejamos que alguma coisa perdure, somos certamente ainda mais tolos por não sabermos apreciá-la enquanto a temos. Se a mudança faz parte da essência da existência, dir-se-ia que é no mínimo sensato fazer dela a premissa da nossa filosofia. Nenhum de nós pode entrar no mesmo rio duas vezes, mas o rio continua a fluir e o outro rio onde entramos também é frio e refrescante." - Somerset Maugham


"Um dos meus lemas favoritos é uma frase de Mahatma Gandhi: «A minha vida é a minha mensagem.» Vistas bem as coisas, o que temos a oferecer são as nossa acções, a forma como vivemos, os nossos valores, as nossas respostas às adversidades.
Este princípio torna-se particularmente pertinente quando lidamos com pessoas difíceis porque, como sabemos, essas pessoas testam, quase sempre, o nosso carácter. Com o tempo, descobri que, se conseguir ter em mente esta frase de Gandhi quando tenho de interagir com uma dessas pessoas que testam o meu carácter, me comporto de uma forma diferente do que se tivesse em mente apenas os meus próprios pensamentos.
Quando paramos um pouco para pensar nas implicações das nossas acções e das nossas palavras, raramente ofendemos alguém ou pioramos uma situação. Em vez de sentir prejudicado e ofendido ou de assumir o papel de intratável, sinta-se orgulhoso da sua graça e da sua presença de espírito.
É mesmo verdade que a sua vida é a sua mensagem." - Richard Carlson

terça-feira, 12 de maio de 2015



"Ela tinha acabado por compreender aquilo que o viajante solitário de longa distância acaba por saber ao fim de meses na estrada - que, com o tempo, uma viagem deixa de ser um interlúdio de distracções e desvios, de busca de vistas, de procura de prazeres, e torna-se uma séries de incoerências, desistindo-se do conforto, abandonado-se ou sendo-se abandonado pelos amigos, passando o tempo em sítios obscuros, acostumado ao conceito de atraso, uma vez que a viagem em si era uma sucessão de atrasos.
Resolver problemas, descobrir refeições, comprar roupa nova e dar as velhas, lavar a roupa, comprar bilhetes, vasculhar hotéis baratos, estudar mapas, estar sozinho mas não solitário. Não tinha que ver com felicidade mas com segurança, com achar serenidade, fazer descobertas em toda esta locomoção e uma serenidade igual quando tivesse um sítio onde pernoitar, como uma ave de passagem a migrar lentamente numa sequência de voos." - Paul Theroux


"(...) - Gostaria de te fazer ver como a vida que te ofereço é muito mais completa do que tudo o que possas imaginar. Gostaria de te fazer ver como a vida espiritual é emocionante e rica de experiências. É imensa. É uma vida tão feliz. Não há nada que se lhe compare, é como estar aos comandos dum avião, sozinho lá no alto, rodeado apenas pelo infinito. Fica-se embriagado com o espaço sem fim. A emoção é tal que não se trocaria por todo o poder e glória do mundo. Estive a ler Descartes no outro dia. Que tranquilidade, que elegância, que lucidez." - Somerset Maugham

segunda-feira, 11 de maio de 2015



"Uma das lições mais duras a aprender acerca das pessoas difíceis é que, se alguma vez essas pessoas mudarem (o que, à partida, é altamente improvável), provavelmente essa mudança nada terá que ver com alguma coisa que você tenha dito ou feito. Claro que todos gostaríamos de poder gabar-nos das nossas proezas a esse nível, mas isso não nos cabe a nós.
A vantagem em deixar de tentar mudar os outros é que também deixará de se sentir tão frustrado com as más experiências com pessoas intratáveis. Tomar a decisão de deixar de tentar mudar as outras pessoas não significa que não se preocupe com os demais. A questão é que pode não estar vocacionado para essa função. Na verdade, as suas teimosias e persistentes tentativas de mudar, melhorar ou iluminar os outros apenas contribuem para que você se transforme numa pessoa intratável - ou, pior ainda, numa daquelas pessoas que tem a mania que sabe tudo.
Cada um de nós tem o seu caminho a percorrer, independentemente de todas as pessoas sem escrúpulos que nos surjam à frente. O seu caminho pode ser o da decência e da honestidade, as suas aspirações podem passar por ser um bom pai ou uma boa mãe e um cidadão respeitável, e, quem sabe, por deixar uma marca positiva no mundo. No entanto, há que ter em conta que os intratáveis que se atravessam no seu caminho também estão, à sua maneira, a percorrer um caminho muito difícil.
Talvez um dia essas pessoas cheguem a uma encruzilhada que as obrigue a decidir enveredar por um caminho mais positivo. Talvez tenham esperança de que essa encruzilhada surja no seu caminho, ou talvez nem saibam que é possível enveredar por um caminho diferente. O que é certo é que você não pode contribuir significativamente para que isso aconteça. Tentar explicar-lhes ou demonstrar-lhes, ou levar as pessoas pela mão e arrastá-las para um caminho melhor são tácticas que, regra geral, não costumam resultar. É claro que se uma dessas pessoas lhe pedir indicações ou ajuda a ler o mapa, não deverá recusar; se ela lhe pedir ajuda, ajude-a, e se vir que ela está prestes a bater contra um muro que não consegue ver, avise-a, mas com alguma contenção. A maior parte das vezes, quando nos intrometemos no caminho de outra pessoa acabamos por nos magoar. Pode até ter consequências negativas com que não contávamos. Porque - a propósito de consequências - uma das vias para a mudança, para esse tipo de pessoas, pode passar precisamente por terem de enfrentar os males que provocam. Ao pouparmos alguém de uma situação dessas estaremos, em boa verdade, a atrasar o seu processo.
Se estiver muito próximo de alguém que está a assumir um percurso de arrogância, desonestidade ou intolerância, a tentação de ajudar essa pessoa a mudar, a corrigir os seus comportamentos ou a tomar consciência dos mesmos será bastante forte e urgente para si! No entanto, a possibilidade de transmitir essa consciência é francamente mais elevada quando você se limita a viver de acordo com os seus princípios de correcção. Ora isso significa que terá de ser uma pessoa decente, prestável e generosa. Sendo você uma pessoa empática e cheia de vontade de partilhar a sua própria experiência, de vez em quando pode aproximar-se de um ou outro intratável e mostrar-lhe o melhor caminho a seguir, mas lembre-se: apenas a outra pessoa pode operar a mudança." - Richard Carlson


"Se voasse por cima disto não teria visto o esplendor e a miséria. Quando uma pessoa diz «Índia» não vejo uma coisa nem sequer cem, mas antes dez mil imagens e muitas ficam-me na mente. Estou sempre a reparar em crianças pequenas que fazem trabalhos duros, a carregar burros com sacos de cascalho, ou a limpar e esfregar; ou, rapazes que não teriam mais de nove anos a correr para um lado e para o outro com sacos grandes, a esvaziar latas de lixo." - Paul Theroux

domingo, 10 de maio de 2015



"Mesmo que não tenhamos prazer no que estamos a fazer, podemos pelo menos aceitar que é isso que temos de fazer. A aceitação significa o seguinte: por agora, é isto que esta situação, este momento, requer que eu faça, por isso faço-o de boa vontade. Por exemplo, provavelmente não somos capazes de ficar satisfeitos por termos de mudar um pneu furado à noite, no meio do nada e debaixo de uma chuva intensa, muito menos de revelar entusiasmo, mas podemos aceitar a situação. Executar uma acção num estado de aceitação significa que estamos em paz enquanto a praticamos." - Eckhart Tolle

sábado, 9 de maio de 2015



"Existe uma diferença entre o que um «rezinga» é e o que faz. Uma das melhores formas de se proteger das perturbações geradas pelos comportamentos destes seres é aprender a estabelecer a diferença entre o que a pessoa é e as suas acções. Na verdade, esta forma de ver as coisas poderá contribuir para que você não se transforme num desses intratáveis que odeiam a humanidade.
Ao nível espiritual, todos somos um e o mesmo aos olhos de Deus. No entanto, não vivemos unicamente no plano espiritual. Somos seres espirituais com uma vivência humana. E, sendo humanos, cada um de nós tem uma personalidade única, uma experiência única e uma história única. Todos temos pontos fortes, fraquezas, medos, esperanças e sonhos. Todos nós fazemos bem determinadas coisas e precisamos de ajuda para concretizar outras. Somo únicos, mas temos em comum o facto de cometermos erros.
Podemos ser perfeitos aos olhos de Deus, mas todos temos imperfeições humanas; quanto mais reflectimos nesta noção, mais fácil se torna aceitarmos as imperfeições dos outros. O truque é tomarmos consciência de que é possível amarmos e gostarmos de uma pessoa e, mesmo assim, aborrecermo-nos, ou até enfurecermo-nos, com o seu comportamento. O acto e o agente são coisas distintas, por isso, não é necessário, nem aconselhável, abordá-los da mesma forma. À medida que vamos aprendendo a diferenciá-los, tornamo-nos menos susceptíveis e conquistamos a oportunidade de constatar que a outra pessoa é, tal como nós, imperfeita." - Richard Carlson


"Um comboio num país velho parece andar para trás, para o interior escuro, simples e primitivo que é o passado remoto. Mas isso é uma ilusão. O comboio só parece ser um artefacto cruel quando sai lentamente da enorme estação desleixada apinhado de passageiros e rola como uma antiguidade barulhenta, agigantando-se com manchas de ferrugem e peganhento de gordura, os seus beliches e assentos obscurecidos por janelas sujas, tudo aquilo a abanar com os zumbidos da máquina estrepitosa, a salpicar de óleo preto os carris enquanto percorre o seu caminho no que parece ser um percurso para dentro da história. O comboio apresenta a verdade de um sítio: por horrível ou selvagem que possa parecer, o interior de um país também é o presente.
Sempre me senti feliz num comboio como este. Há muitos outros viajantes que vão a correr para o aeroporto, para serem interrogados e revistados, e a sua bagagem revolvida à procura de bombas. Fariam melhor em ir numa linha férrea nacional, provavelmente o melhor modo de obter um vislumbre de como as pessoas realmente vivem - dos quintais, dos celeiros, das choupanas, das estradas secundárias e dos bairros de lata, dos factos significativos da vida da aldeia, da miséria que os aviões sobrevoam. Sim, o comboio leva mais tempo e muitos comboios são sujos, e depois? Atraso e sujidade são as realidades da viagem mais gratificante." - Paul Theroux 

sexta-feira, 8 de maio de 2015



"As coisas maiores surgem das coisas mais pequenas que são valorizadas e cuidadas. Na realidade, a vida de todos nós é feita de pequenas coisas. A grandeza é uma abstracção mental e uma das fantasias favoritas do ego. O paradoxo é que o sustentáculo da grandeza é a valorização das pequenas coisas que acontecem no momento presente, em vez da perseguição da ideia de grandeza. O momento presente é sempre pequeno, no sentido de ser sempre simples, mas dentro dele esconde-se também o poder maior. Como um átomo, é uma das coisas mais pequenas, mas contém um poder enorme. No entanto, só poderá aceder a esse poder se estiver totalmente em sintonia com o momento presente. Talvez seja mais exacto dizer que esse poder tem então acesso a si e, através de si, tem acesso a este mundo." - Eckhart Tolle


"Os «rezingas» são péssimos pares de dança. Quando se vê intimidado por uma pessoa mal formada, desagradável, intratável, ou, enfim, difícil, pense nisto: essa pessoa precisa de si para cumprir a sua missão, que é prejudicar-lhe a vida. Essas pessoas querem ser a Ginger Rogers para o seu Fred Astaire. Se você se recusar a ser incomodado, essa pessoa não atingirá os seus objectivos, ou seja, para dançar são precisas duas pessoas, e não há nada de mais frustrante para uma dessas pessoas insuportáveis que perder o seu par de dança.
Há um adágio que diz: prefere ter razão ou ser feliz? Para mim é fácil responder a esta pergunta. Eu não tenho qualquer problema em fazer sentir a um intratável que a «razão» está do seu lado, se isso contribuir para a minha felicidade. Ao longo dos anos aprendi que é muito mais importante para mim ser feliz do que gastar o meu tempo precioso a tentar provar que tenho razão ou a discutir com um «rezinga» inchado." - Richard Carlson

quinta-feira, 7 de maio de 2015



"(...) como mostrava o tipo de viajante que eu era, o que tinha visto e o que perdera da primeira vez. Não andava à procura de novidades - nunca andara. Queria saber mais do mundo, da vida das pessoas. Não era um falcão nas minhas viagens; era mais uma borboleta. Mas era garantida a revelação mesmo para o viajante mais sem desígnio, que era mais feliz e mais receptivo a impressões.
 - «Uma alegria sem desígnio é uma alegria pura» - disse eu, citando Yeats.

E a sabedoria é uma borboleta
E não uma lúgubre ave de rapina." - Paul Theroux


"Se tomar conta dos seus filhos dá significado à sua vida, o que acontecerá a esse significado quando eles já não precisarem de si e talvez  nem lhe derem ouvidos? Se ajudar os outros dá significado à sua vida, você depende do facto de os outros estarem pior do que você para a sua vida continuar a ter significado e para se sentir bem consigo. Se o desejo de sobressair, ganhar ou ser bem sucedido nesta ou naquela actividade lhe dá significado, o que acontecerá se você nunca ganhar ou se a sua maré de sorte um dia chegar ao fim, como é certo que vai acontecer? Então teria de recorrer à sua imaginação ou às suas memórias - algo muito pouco satisfatório e que traz pouco significado à sua vida. «Ter sucesso» em alguma área só é significativo se houver milhares ou milhões de pessoas que não têm sucesso nessa área, caso contrário precisamos que outros seres humanos «falhem» para a nossa vida poder adquirir significado.
Não estou com isto a afirmar que ajudar os outros, tomar conta dos seus filhos ou empenhar-se em atingir a excelência numa determinada área são coisas que não vale a pena fazer. Para muitas pessoas, constituem uma parte importante do seu propósito exterior, mas, por si só, o propósito exterior é sempre relativo, instável e impermanente. Isto não significa que não se deva ocupar com estas actividades. Significa que deve ligá-las ao seu propósito interior primário, para que um significado mais profundo possa fluir através delas." - Eckhart Tolle

quarta-feira, 6 de maio de 2015



"Certos «rezingas» adoram lutar. Dir-se-ia que nasceram para o confronto. Não conseguem desenvolver uma conversa sem emitir uma opinião controversa ou um comentário crítico. Essas pessoas proclamam ser honestas e terra-a-terra quando, na realidade, por razões profundamente enraizadas nos seus corações de «rezinga», vêem adversários em cada uma das pessoas com quem se cruzam. São seres deveras provocadores e ultrajantes no que dizem e fazem porque aprenderam que, com esse comportamento, conseguem quase sempre irritar os seus adversários e levá-los ao confronto. Ao obterem o resultado desejado sentem-se felizes, ou, pelo menos, confortáveis no território do confronto.
Imagine, no entanto, que um desses «rezingas» tem na mão uma raquete de ténis, e que está a jogar contra uma parede, para a frente e para trás, para a frente e para trás sucessivamente. Entretanto, subitamente, a parede desaparece. Que pode ele fazer? Não pode continuar a bater bolas; tem de inventar outro jogo.
Quando você aprende a concordar e, assim, a libertar-se, transforma-se na tal parede a desaparecer. Pelo contrário, quando discorda de uma forma inflamada ou tenta defender-se, o confronto prossegue. Além disso, jamais poderá sair vencedor, porque o idiota apenas pretende manter o clima de confronto. Ora, como estas pessoas são verdadeiramente doentias, nem sequer faz sentido alimentar as falsas questões que colocam. Por isso, concorde e afaste-se. O jogo acabou, e você... saiu vencedor!" - Richard Carlson


"As pessoas consideram os viajantes ousados, mas o nosso segredo culposo é que a viagem é um dos modos mais indolentes de passar o tempo. A viagem não é meramente uma questão de ociosidade, mas também uma evasão complexa de errância que nos permite chamar a atenção para nós mesmos com a nossa conspícua ausência enquanto nos intrometemos na privacidade de outras pessoas - sendo activamente desagradáveis enquanto parasitas fugazes. O viajante é o tipo mais ganancioso de voyeur romântico, e nalgum ponto bem escondido da sua personalidade existe um nódulo indetetável de vaidade, presunção e mitomania que roça o patológico. Por isso é que o pior pesadelo de um viajante não é a polícia secreta nem os feiticeiros ou a malária, mas sim a perspectiva de encontrar outro viajante." - Paul Theroux